NOME DE POBRE NO BRASIL

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

A SABEDORIA PAI D'ÉGUA DOS ALMANAQUES

Fim de 2014. Rotação e translação. A Terra vai enfim completar mais uma volta em torno do Sol, depois de 365 dias e algumas horas. Em torno de si mesma, ela faz o percurso todos os dias. O “quando” tem muito a ver com o “onde”. O tempo e o espaço são irmãos gêmeos. Júpiter leva 11 anos e 314 dias para dar uma volta completa ao redor do Sol. Você descobre a sua idade em Júpiter dividindo-a por 11,3. Este colunista tem 66 anos. Se vivesse em Júpiter (teria 66:11,3=) 5,8. O ano de Plutão é 248,09 vezes maior do que o da Terra. Parece paradoxal, mas se eu vivesse lá, ainda não teria nascido. Como se vê, a volta ao passado não é impossível. A sabedoria dos almanaques é, além do mais, divertida. E onde entram os bichos, as narrativas ficam ainda melhores. O chimpanzé (não é “chipanzé”, como tantos escrevem) adora formigas. E, para caçá-las, mete um galho seco no formigueiro. Os insetos atacam o inimigo, grudando no graveto. E ele se banqueteia com o espeto corrido. Já formigas africanas, ditas caçadoras, atacam um búfalo ferido e de lasquinha em lasquinha, em apenas dez horas, levam os 400 quilos do animal para o formigueiro. Em Jerusalém descobriram um tipo de barata atleta, capaz de correr um metro por segundo. Se jogasse futebol, seria um Garrincha: é capaz de mudar de rumo 25 vezes por segundo durante a corrida. A abelha não morre quando ataca outro inseto. Mas quando pica uma pessoa, a pele dos humanos não lhe permite retirar as pequenas hastes do ferrão: sai junto o abdome, e a abelha morre. Na Idade Média, por superstição, faziam armadilhas para matar gatos. Curiosos, eles iam verificar as arapucas, gerando o ditado: a curiosidade matou o gato. A maioria dos gatos mortos era de cor preta. Desde então é má sorte encontrá-los. Almanaque designa no Árabe o descanso das caravanas de camelos. É quando se contam histórias de todos os gêneros. Afinal, Xerazade ensina: narrar é adiar a morte. (*) Escritor e professor, da Academia Brasileira de Filologia, autor de De onde vêm as palavras (17ª edição) e de Avante, soldados: para trás (publicado também em outros países).

domingo, 21 de dezembro de 2014

O QUARTO REI MAGO

O QUARTO REI MAGO DEONÍSIO DA SILVA º Para Arlinda Volpato, artista plástica Recente manuscrito, encontrado em cavernas próximas de Quram, na região do Mar Morto, traz novas e surpreendentes informações sobre a vida de Jesus. A começar pelo título, que, diferentemente dos anteriores, aparece em letras grandes, encimando a narrativa, e não se chama Evangelho de Fulano, Beltrano, Sicrano ou Outro, mas simplesmente A Vida do Menino Jesus.
Escrito em sânscrito e de autoria feminina, é obra de uma donzela vinda da Índia, acompanhando Jesus, que lá esteve dos doze aos trinta anos, isto é, desde o episódio em que se perde propositalmente dos pais na visita ao templo de Jerusalém, quando então desaparece de todas as narrativas, até sua volta para a Galileia, onde começa a pregar, aos trinta anos. Um dos parágrafos mais desconcertantes é a visita dos magos ao menino, narrada até agora exclusivamente pelo Evangelho de Mateus, uma vez que todos os outros evangelistas o ignoravam ou o omitiram, por razões que desconhecemos. Afinal, os textos sobre o que se entende por A Vida de Jesus, isto é, sua biografia, principalmente os quatro canônicos ou oficiais, mais do que os apócrifos, estão repletos de insólitas contradições, de complexas sutilezas e de mistérios mirabolantes que já duram mais de dois milênios. Mas o que diz Mateus neste parágrafo que todos os outros omitiram? Não sabemos. O original perdeu-se e talvez um dia seja encontrado em outra caverna, preservado por bibliotecário ou bibliotecária anônima – sabemos que mulheres gostam muito de guardar tudo, começando por guardar o sêmen que recolhem dos homens para gerar outros homens, do contrário a espécie desapareceria. Guardar é, pois, prosseguir. Esta é a concepção que elas têm da vida. O que sabíamos da visita dos magos até agora estava exclusivamente nas traduções do texto de Mateus, que fez uma longa viagem, cheia de escalas em muitos portos e portas, fossem de entrada, fossem de saída. Partiu do aramaico, passou pelo hebraico, pelo grego, pelo latim e dali seguiu para muitas outras línguas, incluindo o português, trazido da Europa para o Brasil pelos primeiros navegadores que aqui aportaram entre os séculos XV e XVI. Diz Mateus em alguns poucos versículos do capítulo dois que “nascido Jesus em Belém da Judeia nos dias do rei Herodes, magos vieram do Oriente a Jerusalém para adorá-lo”. Mateus não disse que eram três, nem que eram reis. Não disse também o que nos informa Pradusta – só sabemos o nome da autora no final, pois ela data e assina o documento -, que entre os magos havia uma mulher chamada Asherath, que também estava grávida, e que não trouxe nem ouro, nem incenso, nem mirra, mas um jarro com água fresca. Mulher é assim: pode dar atenção a metais, unguentos e essências que melhorem o ambiente, mas jamais se esquece do essencial. Terminada a adoração, Pradusta diz que os outros magos deixaram a gruta, mas Asherath, não! Ficou conversando mais um pouquinho com o casal e com o menino. Entre as revelações surpreendentes estão estas: José e o menino também falaram. Sabemos que nenhuma criança nasce falando, língua é preciso aprendê-la, qualquer que seja ela, e que José jamais disse coisa alguma em nenhum dos evangelhos. Ele apenas faz o que é necessário para proteger e criar o menino. Desconfia, mas faz. Desconfia que não é o pai do menino, mas fica com Maria, por conselho recebido de um anjo em sonhos. Desconfia que Herodes quer matar o menino e, a conselho do mesmo anjo, de novo em sonhos, foge com a sagrada família para o Egito. Na História da Salvação, foi necessário que José morresse antes do Filho, do contrário teria impedido que ele fosse crucificado. O manuscrito está incompleto, mas vai fazer uma reviravolta na biografia de Jesus. Um comentarista já escreveu que o baralho foi o primeiro documento a reconhecer Asherath na rainha, mas Carlos Magno determinou que ela fosse representada no coringa. O manuscrito continua em exames, pois, sendo apócrifo, pode ser falso. (xx) º Da Academia Brasileira de Filologia, é escritor e professor. Seus livros mais recentes são De onde vêm as palavras (17ª edição) e o romance Lotte & Zweig, já publicado também em outros países.

MISTÉRIOS E SEGREDOS DO CALENDÁRIO

O ano de 2014 envelheceu e vai morrer no dia 31. No dia seguinte, vai nascer um bebezão que já tem nome: 2015. O calendário é irmão da agricultura e da pecuária, surgidas no Neolítico, quer dizer pedra nova (10 mil anos a.C.). Os homens tinham aprendido a fazer ferramentas e passaram a viver em povoações ou aldeias próximas aos rios, de modo a terem água para si mesmos e para os animais que tinham domesticado, como a vaca, a camela e a cabra, que davam leite para eles e para as crianças; e o boi, o camelo e o cavalo, nos quais eles montavam ou aos quais adaptavam carroças e arados, para irem de um lugar a outro, transportarem mercadorias e lavrar a terra para o plantio.
Tal como hoje, eles já precisavam de autoridades para dirimir rivalidades, palavra do mesmo étimo de “rio”. As primeiras autoridades foram os mais velhos. Tais resquícios ainda permanecem em modernos sistemas de poder. Senado tem o mesmo étimo de senex, velho, ancião. E as crianças sabem que podem recorrer aos avós, o STF delas. Os primeiros homens olharam para o Céu para organizar a vida na Terra. A agricultura, a pecuária e o calendário estão ligados ao poder, dado como de origem divina, a teocracia, em que a política é exercida por sacerdotes, intermediários da vontade dos deuses. Dois vestígios deste tempo quase imemorial são o papa e o calendário, chamado gregoriano, porque foi o papa Gregório XIII que, em 24/02/1582, decretou que naquele ano o dia seguinte a 4 de outubro fosse o dia 15. Aqueles dez dias foram para as calendas gregas. Calendário veio de calendae, o primeiro dia de cada mês, palavra do mesmo étimo de calare, convocar. Autoridades religiosas e jurídicas convocavam a todos para nesse dia pagar as contas.
No calendário, o dia e a noite são as medições mais antigas. Em segundo lugar vêm a semana e o mês, medidos pelas quatro fases da Lua. Em último, o ano, que mede o tempo (52 semanas, 12 meses) que a Terra leva para dar uma volta ao redor do Sol. O primeiro dia de nossas vidas é o aniversário. O último é um mistério. (xx) (xx) º da Academia Brasileira de Filologia, escritor, professor federal aposentado, dá videoaulas à distância na Estácio (RJ), é colunista da Caras (SP) e da Bandnews (RJ), e diretor-adjunto da Editora da Unisul (SC).

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

ALGARISMOS ROMANOS. MAS, ALGARISMOS?

Este foi um dos programas mais ouvidos no ano de 2014! Foi sobre ALGARISMOS ROMANOS. MAS, ALGARISMOS? Por que razão os números têm a forma atual: o número 1 tem um ângulo; o número 2 tem porque tem dois; e assim por diante. ZERO, em árabe, tem o significado de VAZIO. Os romanos entretanto tinham apenas letras; I (um), V (5), X (10), L (50), C (100), D (500), M (1.000). O ano de 2014 é escrito assim: MMXIV De 1 a 10: I, II, III, IV, V, VI, VII, VIII, IX, X. De 20 a 100: XX, XXX, XL, L, LX, LXX, LXXX, XC, C. De 200 a 3000: CC, CCC, CD, D, DC, DCC, DCCC, CM, M, MM (2.000), MMM (3.000). Deonísio tem LXVI anos (66). Nasceu em MCMXLVIII (1948). Os algarismos arábicos na verdade são indo-arábicos, pois houve contribuição dos hindus na pesquisa que levou à invenção dos algarismos pelo matemático e astrônomo Abu Jafar Muhammad Ibn Musa Al-Khwarizm (nascido em 780; morto m 850), natural da localidade de Kharizm. Ele foi para Bagdá, no atual Iraque, a convite do califa Abû al-`Abbâs al-Ma'mûn `Abd Allah ben Hârûn ar-Rachîd, mais conhecido por Al-Mamum (nascido em 786; morto em 833). Esse califa (lugar-tenente de Deus na Terra, vigário, mesmo título do Papa) queria reunir os sábios do mundo inteiro na capital de seu império, com vistas a fazer de seu reino um centro que contemplasse todos os saberes. Os romanos não precisavam do zero porque não estavam interessados em cálculos e, sim, em determinar quantidades, contando animais, armas, objetos, soldados, pessoas. E durante muitos séculos toda a Europa, ignorando o zero, viveu muito bem sem ele. Mas a numeração romana persistiu nos nomes de papas, de reis, de séculos, de ruas, das horas nos relógios, dos capítulos de livros etc. números e ângulos.jpg

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

SETE COISAS QUE EU SEI SOBRE GAÚCHOS

SETE COISAS QUE EU SEI SOBRE GAÚCHO.
Morei muito tempo no Brasil meridional e aprendi o seguinte: 1) O Rio Grande é o único estado da federação que faz divisas com três países: Uruguai, Argentina e Brasil. 2) Os gaúchos acham que o Atlântico tem água salgada porque a indiada batia os espetos do churrasco perto de sangas, riachos e rios, que, claro, levaram toda essa água salobra para o mar. 3) Eles acham que o Sol é um fogo de chão que alastrou e ficou fora de controle e ninguém mais pôde apagar; de repente fica fraquinho, quando desce lá pelos lados de Uruguaiana, porque bate o minuano ou uma brisa vinda de Alegrete e ele diminui bastante; 4) Ensinam ciência errado nas escolas: a extinção dos dinossauros deu-se em razão de uma churrascada muito do exagerada que se fez; 5) O Saara antigamente era uma floresta com madeira muito apropriada para canzil, canga e... espeto; navegadores que saíram da Lagoa dos Patos em busca de lenha, trouxeram uns galhos de lá e desde então sempre voltaram para buscar mais; 6) Gaúchos vão pro céu: O Coiso não quer saber de pelear com eles na eternidade; 7) Gaúchas vão pro céu também porque lá o capataz é São Pedro: ele gosta de organizar uns fandangos aos quais até o Patrão comparece com Muié, Filho e Espírito Santo.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

DEONÍSIO DA SILVA: ENTREVISTA A BRUNA FÜCHTER NOS 130 ANOS DA HOEPCKE

Confira a entrevista com Deonísio da Silva, etimologista da revista CARAS 09/12/2014 Isto se chama etimologia, uma atividade fascinante em busca da origem das palavras. Ninguém melhor que ele, professor, etimologista brasileiro e autor de diversos livros premiados para falar conosco sobre o assunto: DEONÍSIO DA SILVA. Deo, como gosta de ser chamado pelos amigos, escreve há 20 anos uma coluna semanal de etimologia na revista CARAS, onde traz curiosidades sobre a origem das palavras. Conversamos com ele sobre seu trabalho e de onde vêm suas inspirações. Confira esta entrevista exclusiva abaixo (Bruna Füchter)
1- Você assina uma coluna na revista Caras sobre etimologia, ou seja, sobre a origem e o significado das palavras. Como você faz para escolher as palavras que serão abordadas? As palavras são escolhidas por vários critérios, mas damos atenção especial àquelas que estão na ordem do dia. Se os leitores repararem bem, as palavras que se destacam no dia a dia estão na revista CARAS. E de seis delas, toda semana, os assinantes e os leitores eventuais sabem a origem, de onde vieram, que escalas fizeram em outras línguas, o que significavam anteriormente e o que hoje significam. 2- O que “palavra” significa para você? Tudo! Com ela amamos, trabalhamos, lutamos, vivemos. Gente de palavra é gente séria. Os vários significados de "palavra", de que é exemplo a expressão "ser pessoa de palavra", isto é, honesta, faz coincidir o que diz com o que é e com o que faz. Mas "palavra" tem suas complexas sutilezas. Ela é meio estranha, provém de uma adaptação feita pela Igreja, que dominou o império romano do século IV ao XV: sua origem é o Hebraico "párehál", que passou ao Grego como "parabolé", virou "parabola" no Latim e "palavra" no Português. "No princípio era o Verbo". "In principio erat Verbum", na tradução do Grego ou do Aramaico, feita por São Jerônimo, para a versão Vulgata, da bíblia, diz o Evangelho de São João, o mais culto dos quatro narradores oficiais. O Alemão prefere "Wort", sempre com inicial maiúscula, mesmo no meio das frases, porque é um substantivo. E mesmo as palavras cruzadas os alemães chamam "Kreuzworträtsel" (eles nunca mexeram no trema!), em que o étimo de "Wort" está ali no meio. O Inglês prefere "word", que, aliás dá nome a um programa de informática para escrever. Mas línguas neolatinas, muito influenciadas pelo Latim eclesiástico, mantiveram o étimo vindo do Hebraico, do Grego e do Latim. "Parola", em Italiano; "parole", em Francês; "palabra", em Espanhol. Veja que, quando os Ingleses inventaram o sistema dos aristocratas consultarem também a burguesia urbana e os produtores rurais para as decisões de governo, eles trouxeram uma palavra de origem francesa, o "parliament", do Latim "parabolare", que deu "parlare" em Italiano e "parler" em Francês. Até o Alemão respeitou este étimo, aceitando "Parlament" em lugar de "Bundeshaus". 3- Qual o poder da palavra no dia a dia? Respondo com um trecho do romance "Avalovara", do escritor Osman Lins, professor da USP, que sei de cor, pois acho memorável: "A palavra sagra os reis, exorciza os possessos, efetiva os encantamentos. Capaz de muitos usos, é também a bala dos desarmados e o bicho que corrói as carcaças podres". Ou com Carlos Drummond de Andrade: "Lutar com palavras é a luta mais vã, entanto lutamos, mal rompe a manhã". Quanto a mim, me defino como "botânico e jardineiro das palavras". Botânico, porque as pesquiso e as ensino aos alunos e aos leitores. "Jardineiro", porque nos romances e contos, eu as trato como flores, para fazer buquês que, espero, levem bons aromas, novos significados, mensagens, entretenimento e segredos embutidos, como as flores. Não sou "gigolô das palavras", como se autodefiniu Luís Fernando Veríssimo. Eu as trato com amor! Aliás, não sou o único a fazer isso, claro. Sérgio da Costa Ramos, para mim o maior cronista do Brasil, faz isso tão bem ou melhor do que eu. 4- Você vem da literatura, já publicou diversos romances e contos. Como é para você escrever para uma revista? Quanto à linguagem, é preciso adaptar-se. O estilo não é o mesmo dos contos e dos romances, não pode ser o mesmo dos "papers" acadêmicos, senão meus textos não seriam entendidos pelo grande público, nem sequer lidos. Quanto a tamanhos e prazos, eu aprendi desde os meus verdes anos a ter disciplina no trabalho e em tudo o que eu faço, ou em quase tudo. Nunca atrasei uma coluna. 5- Há alguma palavra com significado especial pra você? Sim, muitas. Gosto muito de "açucena", uma planta ornamental, que veio do Árabe "as-susana", cujo étimo foi parar em nomes femininos em várias línguas, e que significa lírio, o tal copo-de-leite, como é mais conhecido no Brasil meridional. O "sim" é muito bonito, não apenas nos casamentos, mas nas concessões, nas ajudas, na solidariedade. João Cabral de Melo Neto tem um verso que diz "é tão belo como um sim numa sala negativa", em canção que o Chico Buarque gravou. "Não" também é bonito, ainda mais que tem este xibolete que só o Português, a língua do "ão", tem. 6- O que você gosta de fazer nos momentos de lazer? Ouvir música, principalmente clássica, ler, conversar com amigos, principalmente à beira de pratos e copos, comendo e bebendo, vinho principalmente, pois "in vino veritas" (no vinho, a verdade), e minha maior paixão, inclusive diante das pessoas, é pelo conhecimento, que, como sabemos, desde os tempos míticos do Paraíso traz a morte, pois morreremos disso desde a velha praga divina: "No dia em que comerdes do fruto da árvore do conhecimento, morrereis". Era o fruto proibido! 7- Atualmente mora onde? Vem com frequência vem a Florianópolis? Moro no Rio de Janeiro há doze anos! Desde que, pelo romance "Teresa D´Ávila", já adaptado para teatro, meus ex-colegas da infância e da adolescência me redescobriram, venho com muita frequência a Florianópolis para encontrá-los, principalmente ao Wilson Volpato, seus familiares e amigos comuns. Eu adoro a prosa catarinauta, tão rara em minha vida de expatriado do estado. Os catarinenses têm uma melodia na voz, falam cantadinho, um diapasão que eu perdi no rude sotaque de gaúchos e parananenses, nas palatais retroflexas fortes de paulistas e paulistanos, no chiado de cariocas e fluminenses. E desde há alguns anos, passo uma semana por mês em Florianópolis para desenvolver com Laudelino Sardá um projeto editorial na Unisul, a convite do reitor Salésio Herdt.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

PANDORA, LILI, EVA: TRÊS MULHERES COMPLICADAS

Os antigos gregos consideraram a esperança um dos males que afligiam o mundo. Por isso a colocaram lá no fundo da caixa de Pandora. Mas a caixa foi aberta e os males se espalharam. A esperança era um dos males porque poderia enganar os homens sobre o futuro, fazendo-os acreditar em coisas que jamais aconteceriam.
A doutrina da Igreja pensou diferentemente. Elaborada por sábios, homens experimentados, quase todos anciães, trouxe a esperança ao lado da fé e da caridade para que o trio formasse as três virtudes teologais. Se não foram velhos que as elaboraram, foram velhos que as sancionaram. A Igreja sempre deu preferência aos velhos em seus quadros dirigentes. Ainda hoje é dirigida por um colégio de cardeais, quase todos sessentões ou setentões, presididos por um deles, eleito por seus pares.
Depois, para alcançar o mágico número sete, vieram as quatro virtudes cardeais: temperança, justiça, fortaleza, prudência. Pandora, para os gregos; Lili, para os judeus; Eva para os cristãos. Três versões da criação da primeira mulher. Pandora foi encomenda de Zeus a dois outros deuses: Hefesto e Atena. Ela tem todos os dons, como o nome indica. Cada um dos deuses lhe deu uma qualidade: graça, beleza, persuasão, inteligência, paciência, meiguice, habilidade na dança e nos trabalhos manuais. Prometeu avisou a Epimeteu, seu irmão, que não recebesse nenhum presente dos deuses. Mas ele se esqueceu da advertência e casou-se com Pandora.
A caixa que ela abriu era dele. Tinha ganhado de outros deuses de presente de casamento, mas deveria permanecer fechada. Nas três versões, a mulher leva o homem para maus caminhos. Esses mitos nascem na passagem do matriarcado para a patriarcado. Bom domingo para todos, na companhia de suas Pandoras, Lilis, Evas ou outros nomes. A essência feminina está em todas elas. (xx) º da Academia Brasileira de Filologia, escritor, professor de videoaulas à distância na Estácio (RJ), colunista da Rádio Bandnews (RJ) e diretor-adjunto da Editora da Unisul (SC).

domingo, 23 de novembro de 2014

O DESTINO VAI E VEM DE TREM

A Estrada de Ferro Donna Thereza Christina tem este nome em homenagem à esposa de Dom Pedro II, a última imperatriz do Brasil. A pequena ferrovia tem apenas 164 km de extensão e foi construída pelos ingleses entre os anos de 1880 e 1884. Seu objetivo era transportar carvão, mas levava também vagões de passageiros. Tudo começara na década de 1830, quando tropeiros que faziam o trajeto entre serra-abaixo e serra-acima, descobriram “pedras que se incendiavam”. O negócio não deu certo e em 1902 a República a encampou. Em 1996, já na Era FHC, a ferrovia foi privatizada por R$ 18,5 milhões, uma pechincha. Pouco tenho escrito sobre o trem em minha vida. Mas ele teve presença marcante em momentos decisivos. Incluindo os ramais, este pequeno trecho passava também por Urussanga, em cuja paróquia fui batizado pelo padre Agenor Marques; então com 33 anos, ele faleceu em 2006, aos 91 anos; por Tubarão, onde estudei no Seminário Nossa Senhora de Fátima; e por Siderópolis, onde nasci. Passando por essas então pequenas cidades, não passava entretanto por São Ludgero, onde fiz meu primeiro ano de ensino médio, no Educandário São Joaquim; nem por Jacinto Machado, em cujo Grupo Escolar de mesmo nome fiz o curso primário. Guardei os nomes das quatro professoras normalistas com as quais tanto aprendi naqueles anos: Edite, Priscila, Alda e Alzira. No ramal de Araranguá, embarcou rumo ao seminário, com o fim de preparar-se para o sacerdócio durante os próximos catorze anos, um coroinha chamado Deonísio, a quem o Padre Herval Fontanella ensinou o Latim necessário ao ofício. Na estação, empurrados pelos guardas, embarcaram também dois de três bêbados cambaleantes. O terceiro não conseguiu embarcar. Já no trem, perguntei se eles estavam tristes por que um dos amigos não tinha embarcado. Eles me responderam que quem deveria estar triste era o que ficou: eles tinham vindo à estação para se despedirem dele. (xx) º da Academia Brasileira de Filologia, escritor e professor, trabalha nas universidades Estácio (RJ) e Unisul (SC) e faz colunas de etimologia na Rádio Bandnews e na revista Caras.

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

A ESPERANÇA, UM DOS MALES DA REPÚBLICA

A palavra república veio do Latim “res publica”, coisa pública. Os gregos usavam “politeia”: polis (cidade) governada por assembleia de cidadãos. Nem tudo no Brasil atrasa! Algumas coisas são antecipadas. O golpe de Estado que proclamou a República estava planejado para acontecer no dia 20 de novembro de 1889. Como era uma conspiração e o governo de Dom Pedro II descobriu a tempo, determinou a transferência dos líderes, a maioria deles maçons e militares, para províncias distantes. Os conspiradores souberam das intenções do imperador e o transferiram às pressas para o exílio, antecipando o golpe em cinco dias e cancelando as transferências. Afinal, ser transferido do Rio era um castigo! Tragédias e farsas presidiram aquela proclamação. O líder militar do levante, o marechal Deodoro da Fonseca, era monarquista. Quando, a cavalo, proclamou a República, tinha sido tirado da cama há apenas algumas horas. Estava muito doente, com febre, tanto que morreu menos de dois anos depois. O povo assistiu abestalhado ao que acontecia, pensando tratar-se de um desfile em homenagem a alguém, talvez ao próprio Dom Pedro II. Mas depois vieram as tragédias, algumas das quais persistem até hoje, sendo a da corrupção a mais grave. Afinal, se antes a república foi concebida como uma concessão dos militares ao povo, hoje é tida como uma concessão dos empresários ao povo. Por isso, o custo estratosférico das eleições! Ninguém sabe ao certo quanto custa uma eleição, mesmo porque algumas das verbas utilizadas são secretas.
Houve muitas lutas para consolidar o novo regime, sendo a de Canudos a mais retumbante, com milhares de mortos. Não fosse o talento do engenheiro e jornalista Euclides da Cunha, será que teríamos sabido direito o que aconteceu? Quem escreve, sempre faz falta quando não está. Foi assim também na Guerra do Paraguai, algumas décadas antes. O Visconde de Taunay estava lá para narrar a Retirada da Laguna. O povo brasileiro tem esperança de que a República melhore. Um dos males da caixa de Pandora era a esperança, pois ela poderia enganar-nos sobre o futuro. Mas a deusa Pandora, depois de deixar escapar todos os males do mundo da caixinha que não deveria abrir, mas abriu, fechou a tempo de guardar a esperança ali dentro. (xx). º da Academia Brasileira de Filologia, escritor, professor de videoaulas à distância na Estácio (RJ), colunista da Rádio Bandnews (RJ) e diretor-adjunto da Editora da Unisul (SC).

terça-feira, 11 de novembro de 2014

MEDOS E PAVORES TROCARAM DE LUGAR (O Globo, 10 nov 2014)

Tal como Constantinopla, nossas cidades já não nos protegem mais, pois os inimigos não vêm de fora, eles estão no meio de nós.
O pavor do homem medieval era chegar tarde da noite e encontrar fechadas as portas da cidade. Protegidos por muralhas, seus habitantes tinham medo de ataques de inimigos, de aves de rapina e de animais ferozes, principalmente de lobos, e até do vilão, o morador da vila, que, desde então, tem servido para caracterizar o personagem que representa o mal em romances, peças de teatro, novelas e filmes. Sem contar que não apenas os vilões, mas também animais ferozes e lendários chegaram à cultura brasileira, de que é exemplo o lobisomem. Surgido na Grécia antiga, o homem-lobo aportou ao Brasil, depois de escala em Portugal, e foi personagem referencial de romances e de peças de teatro e telenovelas, de que são exemplos “O coronel e o lobisomem”, de José Cândido de Carvalho, e “Roque Santeiro”, de Alfredo Dias Gomes. Nos arredores de Viseu, em Portugal, ainda existe a Cova do Lobisomem, onde o bicho se escondia depois dos ataques noturnos e aguardava o amanhecer, quando voltava a ser homem outra vez. O vilão ganhou má fama porque ladrões, assassinos e outros malfeitores, quando podiam evitar prisões e masmorras, ou delas fugir, iam esconder-se nas vilas, misturando-se a seus inocentes e rudes habitantes, tal como nos mostrou o filme “O feitiço de Áquila”, ambientado na Europa medieval, no século XIII. Nessa história lendária, um bispo apaixona-se por uma bela mulher (Isabeau D’Anjou), cujo pai morreu na Primeira Cruzada. Quando esta foge com um militar (Etienne de Navarre), o bispo faz um pacto com o demônio, com o fim de garantir que os amantes fiquem “sempre juntos, mas eternamente separados”. Para isso, Isabeau é transformada em falcão durante o dia, e Etienne em lobo, durante a noite. Um ladrão fugitivo (Philippe Gaston), que vive entre os vilões, um caçador de lobos (Cezar) e um monge confessor que exerce a medicina (Imperius) também se destacam nas tramas, que incluem um eclipse solar de três dias, quando o feitiço poderá ser quebrado, pois haverá “um dia sem noite e uma noite sem dia”. Outras narrativas lendárias representaram medos diversos, como Chapeuzinho Vermelho, o lobo e o cordeiro, a mula sem cabeça etc. Mas hoje o grande medo não é mais morar na selva, transformada em santuário, ou em pequenas povoações e cidades. Ao contrário, quanto maior a cidade, maiores os perigos. É por isso que a segurança e a violência urbana, vestindo outras roupas, vêm sendo temas inevitáveis de eleições presidenciais, estaduais e municipais, tanto para cargos no Executivo como no Legislativo.
A Idade Média defendeu suas cidades com muralhas até o dia 29 de maio de 1453, quando os exércitos de Maomé II, utilizando canhões, abriram imensos buracos nas muralhas de Constantinopla, atual Istambul, por onde entraram para derrubar o ainda poderoso império bizantino. As lutas foram tão sanguinolentas e desorganizadas que o corpo de Constantino XI, o último imperador bizantino, nunca foi encontrado. Naquela semana, realizava-se dentro das muralhas um simpósio que discutia se os anjos tinham sexo, expressão que passou a designar a perda de tempo com assuntos inúteis, enquanto temas importantes são ignorados. Governantes e governados, por exemplo, desconheciam o canhão, mas sabiam distinguir anjos, arcanjos, querubins, serafins, tronos, potestades e demais cargos da hierarquia celestial! Tal como Constantinopla, nossas cidades já não nos protegem mais, pois os inimigos não vêm de fora, eles estão no meio de nós. E muitas vezes são eles que nos governam. Mas todos os candidatos, como Pezão, cujo apelido se deve ao fato de calçar 47 e meio, isto é, quarenta e sete grãos de cevada e meio, origem do número dos sapatos, e o “bispo” Crivella prometeram resolver todos os nossos problemas. Bastaria que tivéssemos votado neles! (xx) Deonísio da Silva é escritor e professor.

sábado, 8 de novembro de 2014

MEIO SÉCULO SEM CECÍLIA MEIRELES

Faz cinquenta anos que morreu Cecília Meireles, escritora homenageada em São Carlos com o nome de um colégio. Foi Cecília Meireles quem fundou a primeira biblioteca infantil do Brasil, em 1934, aos 33 anos. E em sua obra poética destacam-se versos encantadores, escritos especialmente para as crianças, como estes: “Esta menina/ tão pequenina/ quer ser bailarina”. “Não conhece nem dó nem ré/ mas inclina o corpo para cá e para lá”. (...) “Mas depois esquece todas as danças,/ e também quer dormir como as outras crianças”. Estes versos de “Mulher ao Espelho” estavam na parede do quarto de Manuela, quando pequenina: “Já fui loura, já morena,/ já fui Margarida e Beatriz,/ já fui Maria e Madalena./ Só não pude ser como quis”.
Cecília, órfã, foi criada pela avó, pode ter encontrado refúgio no catolicismo e no espiritismo. No “Pequeno Oratório de Santa Clara”, santa de sua devoção, escreverá: “os santos, com seus serviços./ Entre os humanos tormentos,/ São exemplo e aviso,/ pois estamos tão cercados,/ de ciladas e inimigos!”. Cecília publicou o primeiro livro aos 18 anos. Três anos depois, aos 21, casava com o português Fernando Correia Dias, artista plástico, que, sempre muito depressivo, suicidou-se em 1935. Cecília voltou a casar-se em 1940, com Heitor Vinícius da Silveira Grilo, professor e engenheiro agrônomo, que, viúvo de Cecília, morreu em 1972. Para mim, sua obra solar é o “Romanceiro da Inconfidência”. Extraí das páginas mais gloriosas do longo poema os versos para as epígrafes de todos os capítulos de “Avante, soldados: para trás”, que recebeu em Cuba o Prêmio Internacional Casa de las Américas, em 1992. Alguns dias depois, na UFSCar, um colega me disse no cafezinho: “Por que será que te premiaram?”. Repliquei: “Você leu o romance?”. “Não”. “Então”. Penso que não sabe até hoje que a equipe presidida por José Saramago estava enganada. Talvez a tenham fascinado as epígrafes. º da Academia Brasileira de Filologia, escritor, professor de videoaulas à distância na Estácio (RJ), colunista da Rádio Bandnews (RJ) e diretor-adjunto da Editora da Unisul (SC).

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

BOMBÁSTICO, CARTEIRA E CARTEIRAÇO

Este programa, da Rádio BandNews FM, é ouvido até em Siderópolis (SC), minha terra natal. Foi postado pela cantora e compositora Isis Bez Birolo. Ontem, quinta-feira, demos a etimologia de CARTEIRA, CARTEIRAÇO E BOMBÁSTICO, entre outras palavras da semana, a propósito do entrevero entre o juiz, que abusou da autoridade, e Luciana Tamburini, funcionária do Detran, que cumpriu a lei e foi punida! E justamente por um juiz, valha-nos, Deus, que recusou - e conseguiu! - ser "mais igual" do que os outros diante da Lei Seca. Maíra Gama Martins também participou, como sempre, principalmente nos bastidores. https://www.youtube.com/watch?v=MVwnkoGc9P0&feature=youtu.be

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

ACENDER UMA VELA A DEUS, OUTRA AO DIABO

Descobri o quanto o azeite foi importante para Santo Agostinho escrever seus livros depois de integrar uma banca de tese de uma cantora lírica, Ria Fucci Amato, que fez uma pesquisa abordando o que famoso santo e filósofo tinha escrito sobre MÚSICA. No estudo descobri também que Nero foi acusado de ter posto fogo em Roma porque tinha feito a Reforma Agrária na África e contrariado poderosos chefes militares que tinham ficado latifundiários com as conquistas. Mas nosso assunto de hoje foi uma expressão curiosa, invocada quando a pessoa quer agradar lados contrários entre si: ACENDER UMA VELA A DEUS, OUTRA AO DIABO. A expressão veio da França para Portugal, e daí ao Brasil, mas os personagens foram trocados: na França, diz-se acender uma vela a São Miguel, outra à sua Serpente.
O Diabo tomou a forma de serpente ainda no Paraíso quando tentou Adão e Eva. Satanás, seu outro nome, não conseguiu nada com Adão, mas com Eva, sim! Quem mais profundamente escreveu sobre esta e outras questões teológicas foi Santo Agostinho. Ele nasceu em Tagaste, ma África, e foi bispo de Hipona, também na África. Na época em que ele, voltando de Milão e de Roma, foi viver no continente em que nascera, a África produzia muito azeite e por isso ele pôde ler, estudar e escrever muito à noite, porque todos podiam manter acesas as lamparinas de azeite. Era ele quem rezava assim: "Senhor, dai-me a castidade, mas não já", porque teve muitas namoradas, e teve um filho com uma delas, a que chamou Adeodato,que significa "A Deus dado".

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

A MACAXEIRA DA PETROBRÁS E O TCU

Os doutores do Tribunal de Contas da União (TCU) gastaram horas discutindo se os trabalhadores das refinarias da Petrobrás no Nordeste deveriam comer 120 ou 220 gramas de macaxeira (mandioca ) no café da manhã. E questionaram o preço pago pela empresa: R$ 2,78 pela ração. Argumentaram que no mercado é R$ 0,39 por 220g. Está no relatório que lavraram.
Pergunto : quantas toneladas de macaxeira ( mandioca ) poderiam ser compradas com o dinheiro que custaram a reunião e o relatório? Os ordenadores das despesas deixaram de fazer o que estavam fazendo e foram explicar-se aos doutores. Ainda bem que foram objetivos neste caso : "a convenção coletiva dos trabalhadores da indústria da construção pesada exige que o café da manhã respeite os regionalismos ". Só no Brasil!
Onde estavam os mesmos doutores do Tribunal de Contas da União (TCU) quando deixaram passar os 175 milhões que as equipes do juiz Sérgio Moro estão conseguindo trazer de volta para os cofres públicos, roubados na maciota pelos criminosos, agora arrependidos, da rubrica "delação premiada "? Só no Brasil!

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

ASSASSINETE: NOVA PALAVRA NO PORTUGUÊS DO BRASIL

A LIBERDADE NÃO É OBRIGATÓRIA. E SURGE UMA NOVA PALAVRA NO PORTUGUÊS: ASSASSINETE, MISTURA DE ASSASSINA COM PERIGUETE. Como sempre faço, levantei cedo e e fui tratar de minhas calopsitas. A gaiola está aberta na varanda, elas dão uma voltinha por ali e voltam para beber água, comer, dormir. Preferem a gaiola! Estava lendo os jornais e vi que o casamento de Suzane von Richthofen com Sandra Gomes, ambas presidiárias, é notícia no mundo inteiro, com alguns detalhes muito curiosos:
1) Suzane, depois de cumprir 12 anos dos 38 aos quais foi condenada, obteve o direito de cumprir a pena em casa, mas renunciou para casar com Sandra, que ainda não tem o benefício. 2) Suzane matou os pais, coma ajuda do namorado e de um amigo do casal; Sandra integrou o grupo que sequestrou uma empresária e matou o filho dela porque o regaste não foi pago. 3) Para casar com Suzane, Sandra desfez os laços amorosos que mantinha com Elize Matsunaga, que matou e esquartejou o marido. E os romancistas somos nós?

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

A LEVIANA, A SIRIGAITA, O FOGUETE E O FOGUETÃO

Na semana passada, Ana de Hollanda e Edwaldo Arantes estavam presentes à mesa quando eu disse em palestra em Guaxupé (MG), nos 50 anos do Unifeg, cujo reitor é nosso amigo Reginaldo Arthus, que Aécio Neves, ao chamar Dilma Rousseff de "leviana", ignorara que a palavra pode ser entendida como prostituta no Nordeste, e que, portanto, representara ofensa que o Lula rapidamente soube explorar, ao amplificá-la e recriminar seu uso. Imediatamente a mídia passou a mostrar trechos de debates em que o ex-presidente chamava o opositor de leviano. MAS NO MASCULINO! E isso fazia toda a diferença. Estes detalhes são decisivos para quem usa a língua portuguesa como ferramenta de trabalho, como é o caso de quem atua na política.
Muitas pessoas gostam de saber da viagem que as palavras fazem ao longo da história. E o feminino "leviana" tomou este tom pejorativo naquela região do Brasil. Leviano é sinônimo de inconstante, precipitado, irresponsável. Jazem aí as razões profundas de aplicar-se o feminino como equivalente ou próximo de sirigaita. Hoje leio no jornal "O Público", de Portugal, a manchete que utiliza palavra que no Brasil não é usual para designar o foguete espacial: FOGUETÃO. Como se chegou a esse significado? O latim vulgar CODA virou COET no catalão, depois COHETE no português e, por influência de FOGO, do latim "focus", que designa também a luz que você deve seguir num debate ou num projeto, na escuridão de muitas palavras, virou FOGUETE. Mas o aumentativo FOGUETÃO designou originalmente um cabo lançado a embarcações ameaçadas de naufrágio e aos náufragos. Com o advento da conquista do espaço sideral, a palavra veio a designar o gigantesco artefato que lança a nave espacial. http://www.publico.pt/mundo/noticia/foguetao-antares-de-empresa-orbital-explode-apos-lancamento-1674463

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

MORREU O JORNALISTA E ESCRITOR GAÚCHO JANER CRISTALDO

Gaúcho de Santana do Livramento, onde nasceu em 1947, o jornalista, escritor, professor e tradutor Janer Cristaldo, Doutor em Letras pela Sorbonne, partiu para a eternidade na noite passada. Minha filha Manuela e eu o visitamos há alguns dias no Hospital Samaritano, em São Paulo. Sem voz, falou apenas por gestos, meneios da cabeça e palavras proferidas com o movimento dos lábios. Pareceu muito contente com nossa visita, apertou nossas mãos e nos ouviu com atenção, entendendo tudo o que lhe dizíamos. Seu blogue era visitado por cerca de 1,5 milhão de leitores. No último post, em 5/9/2014, ele recomendou a leitura de um livro do professor americano Mark C. Taylor, da Universidade de Columbia: "Crise no Campus: um plano arrojado para reforma das nossas Faculdades e Universidades (Knopf, 2010)". Destacou que o autor considera insustentável o sistema de doutorado, nos Estados Unidos e em muitos outros países, e que precisa de mudanças urgentes. Porque, do modo como estão os doutorados, interessam apenas ao corpo docente, em prejuízo dos estudantes. E conclui: "a realidade é que existem poucos empregos para as pessoas que gastaram até doze anos em sua formação". Grande Janer! Foi sempre um intelectual inquieto, culto, de vastas leituras, autor de livros muito bem escritos, tradutor de Ernesto Sabato, de autores suecos, franceses etc. Vão fazer falta suas pertinentes e polêmicas intervenções.

domingo, 26 de outubro de 2014

É HOJE O DIA D Deonísio da Silva º Os eleitores brasileiros escolhem hoje o próximo presidente da República. E ao cair da noite vão saber a quem escolheram. Se reelegeram a presidente Dilma Rousseff ou se resolveram mudar, entregando a presidência a Aécio Neves. Tenho amigos que declararam o voto no PT e tenho amigos que declararam o voto no PSDB. Não gosto de declarar o voto. O voto é secreto. Esta é uma garantia adicional para o eleitor. E desconfio que os institutos de pesquisa estão errando bastante porque muitos brasileiros andam escaldados e acham que se falarem o que pensam, vão sofrer represálias. Já escrevi e reafirmo que o PT abriga setores nazifascistas que já prejudicaram até mesmo seus próprios companheiros. Quanto mais os adversários! De outro lado, uma das marcas principais do PSDB quando no poder foi a entrega do patrimônio do Estado a preço de banana a poderosos grupos internacionais. Sem contar que abandonou as universidades federais a uma situação de penúria raramente vista em outros quadriênios. No caso, um octoênio, pois inventou também a praga da reeleição. Bem, o povo vai escolher a quem quiser. E é soberano. Os intelectuais deixem de ser arrogantes, como o são tantos que conhecemos, e reconheçam que em 2015 vai exercer a presidência aquela pessoa que o povo vai escolher hoje. Fim º da Academia Brasileira de Filologia, professor e escritor, colunista da Rádio Bandnews (RJ) e diretor-adjunto da Editora da Unisul (SC).

domingo, 19 de outubro de 2014

NOMES NO BRASIL: LADY GAGA VIROU NEYDE GAGÁ

Convido meus leitores a degustar uma reflexão bem simples que venho fazendo a partir dos nomes mais comuns no Brasil. Durante muitos anos foram José, João, Manuel, Antônio e Pedro, para os meninos; e Maria, Ana, Antônia, Cecília e Isabel, para as meninas. Após a Segunda Guerra Mundial, depois de dividirem o mundo entre os quatro vencedores, na Conferência de Yalta – Churchill, Roosevelt, Stálin e De Gaulle -, coube aos EUA a América Latina, um novo mercado para músicas, filmes, histórias em quadrinhos etc. A partir da década de 1980, entretanto, com as defesas da cultura nacional seriamente avariadas, o que era influência passou a dominação. E predominaram nomes do Inglês, mas em estranha grafia, pois nem os pais, nem os escrivães, dado o rebaixamento do ensino que acompanhou a invasão, sabiam o Inglês. Assim, surgiram Uóxynton, Máycon, Xuarzenéguer e Jéquysson, para os meninos; e Madona, Jéssyca, Byoncy, Jennyfer e Neyde Gagá (era para ser Lady Gaga), para as meninas. A letra Y tornou-se obrigatória! Pois agora mudou de novo. Prevalece a força da televisão, não mais a da “folhinha” com o santo do dia, manifestada nos nomes de personagens tirados de telenovelas e de homilias dos novos pastores, que evitam o Novo testamento, preferindo personagens do Antigo Testamento, onde Jesus, São Pedro e São Paulo, entre outros, não são encontrados! Assim, temos entre os escolhidos nomes de reis bíblicos, como Daví, Saul e Salomão, e dos profetas Ezequiel, Isaías e Zacarias, para os meninos. Para as meninas predominam nomes de atrizes ou das personagens que elas representam nas novelas, como Giovana, Sofia, Débora e Viviane . Estou lendo uma biografia de Dionisius, 6º rei de Portugal, mais conhecido pelo apelido de Dinis, como eu o sou por Deo. Um dia o rei pescou um soalho, peixe hoje extinto, de 17,5 arrobas ou 262,5 quilos. Foi documentado pelo tabelião real. E vocês, o que pescaram da minha coluninha? (Escrevam para deonisio@terra.com.br). º da Academia Brasileira de Filologia, professor e escritor, colunista da Rádio Bandnews (RJ) e diretor-adjunto da Editora da Unisul (SC).

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

LADY GAGA VIROU NEYDE GAGÁ, MAS COM Y

Convido meus leitores a degustar uma reflexão bem simples que venho fazendo a partir dos nomes mais comuns no Brasil. Durante muitos anos foram José, João, Manuel, Antônio e Pedro, para os meninos; e Maria, Ana, Antônia, Cecília e Isabel, para as meninas. Após a Segunda Guerra Mundial, depois de dividirem o mundo entre os quatro vencedores, na Conferência de Yalta – Churchill, Roosevelt, Stálin e De Gaulle -, coube aos EUA a América Latina, um novo mercado para músicas, filmes, histórias em quadrinhos etc. A partir da década de 1980, entretanto, com as defesas da cultura nacional seriamente avariadas, o que era influência passou a dominação. E predominaram nomes do Inglês, mas em estranha grafia, pois nem os pais, nem os escrivães, dado o rebaixamento do ensino que acompanhou a invasão, sabiam o Inglês.
Assim, surgiram Uóxynton, Máycon, Xuarzenéguer e Jéquysson, para os meninos; e Madona, Jéssyca, Byoncy, Jennyfer e Neyde Gagá (era para ser Lady Gaga), para as meninas. A letra Y tornou-se obrigatória! Pois agora mudou de novo. Prevalece a força da televisão, não mais a da “folhinha” com o santo do dia, manifestada nos nomes de personagens tirados de telenovelas e de homilias dos novos pastores, que evitam o Novo testamento, preferindo personagens do Antigo Testamento, onde Jesus, São Pedro e São Paulo, entre outros, não são encontrados! Assim, temos entre os escolhidos nomes de reis bíblicos, como Daví, Saul e Salomão, e dos profetas Ezequiel, Isaías e Zacarias, para os meninos. Para as meninas predominam nomes de atrizes ou das personagens que elas representam nas novelas, como Giovana, Sofia, Débora e Viviane . Estou lendo uma biografia de Dionisius, 6º rei de Portugal, mais conhecido pelo apelido de Dinis, como eu o sou por Deo. Um dia o rei pescou um soalho, peixe hoje extinto, de 17,5 arrobas ou 262,5 quilos. Foi documentado pelo tabelião real. E vocês, o que pescaram da minha coluninha? (Escrevam para deonisio@terra.com.br). º da Academia Brasileira de Filologia, professor e escritor, colunista da Rádio Bandnews (RJ) e diretor-adjunto da Editora da Unisul (SC).

O BRASIL ÀS VEZES NOS SURPREENDE

https://www.youtube.com/watch?v=ipcwiQwa0JM Eles conhecem as músicas de Nelson Mandela. Não andariam ao lado de transeuntes porque sempre andam pela calçada. Não casariam com alguém do sexo oposto. Acham que na família deles não existe nenhum heterossexual. Acham bom Nelson Mandela vir cantar em Campina Grande, embora já tenham dançado alguma música ao som dele.

domingo, 12 de outubro de 2014

SEGUNDO TURNO: A OUTRA VOLTA DOS PARAFUSOS

O pavor do homem medieval era chegar tarde da noite e encontrar fechadas as portas da cidade. Seus habitantes tinham medo até do vilão, o morador da vila, sem muralhas, e por isso vilão virou sinônimo de covarde, trapaceiro. Hoje o grande medo é morar nas cidades. Quanto maior a cidade, maiores os perigos. E segurança tornou-se tema forte de campanhas políticas em todos os níveis. A segurança foi um dos temas do debate entre os candidatos a governador do Rio que chegaram ao segundo turno: o “bispo” Marcelo Crivella, “da Igreja Universal do Reino Deus, e Luiz Fernando Pezão, atual governador e ex-prefeito de Piraí, de apenas 20 mil habitantes. Pezão calça 47,5. Esta é a origem do apelido. No debate que a Bandnews promoveu entre os dois na quinta-feira passada, coube-me sentar ao lado do professor e economista Carlos Lessa, que foi presidente do BNDES nos governos Lula. Lessa me falou com entusiasmo de outra candidatura que ele está promovendo: a canonização do Padre Cícero Romão Batista, o Padim Ciço. E me convidou para ajudá-lo. Propus-lhe um mutirão para canonizar Padim Ciço e também a catarinense Albertina Berkenbrock e o Padre Teixeira, nome de rua em São Carlos, cujos processos de santidade estão emperrados. Concordando, ele lembrou entretanto um papel importante dos evangélicos. Migrantes de todo o Brasil, principalmente do Nordeste, sentem-se sozinhos, longe da família, nas grandes cidades onde chegam. O templo passa a ser, então, a família deles. Enquanto a Igreja se recusa a canonizar o Padim Ciço, os pastores evangélicos utilizam a fama dele para atrair novos fiéis a seus templos. Muita coisa precisa mudar no Brasil. E no Vaticano também. Não canoniza o Padim Ciço, Albertina, o Padre Teixeira e tantos outros. Quem perde com isso? O povo, claro, e aqueles que com ele trabalham. Como os governos, também a Igreja tem que ouvir o povo. (*) da Academia Brasileira de Filologia, professor e escritor, colunista da Rádio Bandnews (RJ) e diretor-adjunto da Editora da Unisul (SC).

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

ACORDO ORTOGRÁFICO: DEONÍSIO RESPONDE TUDO A THAÍS NICOLETI DE CAMARGO

http://thaisnicoleti.blogfolha.uol.com.br/2014/10/06/lingua-e-patrimonio-do-povo-brasileiro-leia-entrevista-com-o-filologo-deonisio-da-silva/ Meus amigos, Thaís Nicoleti de Camargo fez uma entrevista como há tempos eu não via: preparou-se, formulou perguntas pertinentes, completou-as com outras mais tarde. O resultado está abaixo. Avaliem vocês mesmos, eu já lhe dei nota dez, que ela bem a merece! "A mulher é a melhor parte da natureza humana", diz um personagem de meu romance "Avante, soldados: para trás", já pôster em várias línguas. E, como pôster, saudava as leitoras, todos os anos, quando vinha maio, e eram diretores editoriais da Siciliano a Lígia Siciliano Novazzi e o Pedro Paulo de Sena Madureira, que lançaram o romance, hoje em 10a edição. Thaís Nicoleti PerfilThaís Nicoleti de Camargo é consultora de língua portuguesa da Folha e do UOL. PERFIL COMPLETO “Língua é patrimônio do povo brasileiro”; leia entrevista com o filólogo Deonísio da Silva POR THAÍS NICOLETI 06/10/14 18:51 Ouvir o texto Ultimamente, a ortografia tem ocupado na mídia espaço maior que o esperado, o que talvez se explique não por ser um tema apaixonante, mas pelo fato de, no Brasil, ser objeto de lei. A perspectiva de haver novas mudanças na grafia das palavras cria certo alvoroço tanto no meio editorial como na imprensa e nas escolas, enfim, entre aqueles que mais diretamente estão comprometidos com o tema, seja porque publicam obras, seja porque ensinam a escrever. O fato de existir no Senado um grupo técnico de trabalho encarregado de rever o último Acordo, que, embora date de 1990, entrou em vigor em 2009, cria alguma apreensão e, de certa forma, desestimula os esforços que têm sido feitos em direção à adaptação às novas regras. De início, muitas foram as vozes que o criticaram, afinal, a necessidade de unificação da grafia do português nos países lusófonos não parecia ser algo tão urgente. Além disso, antes da publicação do Volp (Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa), havia muita dúvida sobre as novas regras e, consequentemente, proliferaram não só as criticas como também os equívocos. Depois da publicação do Vocabulário (e de uma errata com substituições, correções e aditamentos) e, sobretudo, depois de ser o corpus posto gratuitamente à disposição para consulta no site da ABL (www.academia.org.br), os ânimos se acalmaram e o processo de adaptação parecia seguir seu rumo. Eis que a divulgação de uma proposta de ortografia fonética, que imporia grandes mudanças à ortografia vigente (em nada comparáveis à supressão de alguns acentos e à alteração nas regras do hífen), vem novamente trazer à tona o tema da ortografia. Hoje quem conversa com o blog a respeito do assunto é o professor Deonísio da Silva, que é membro da Academia Brasileira de Filologia, professor universitário, escritor e doutor em Letras pela Universidade de São Paulo. Respeitado nos círculos acadêmicos, Deonísio é também muito conhecido fora deles – e não é à toa, pois sua página de etimologia na revista “Caras” é sucesso há 20 anos. Além desse trabalho, Deonísio tem uma coluna na Rádio Bandnews Fluminense e vem publicando, ao longo de sua vida, títulos de grande interesse, entre os quais está o best-seller “De Onde Vêm as Palavras”, já na 17ª edição. É autor de 34 livros, em meio aos quais se destacam outras obras voltadas à etimologia (“A Vida Íntima das Frases” e “Palavras de Direito”) e os romances “Lotte & Zweig” (2012), baseado na vida do escritor, poeta e dramaturgo austríaco Stefan Zweig, “Teresa d’Avila” (1997) e “Avante, Soldados: para trás” (2005), romance que recebeu o Prêmio Internacional Casa de las Américas, em júri presidido por nada menos que José Saramago – e o Nobel de Literatura não lhe poupou elogios. Leia, a seguir, a entrevista com o professor Deonísio da Silva: Thaís Nicoleti – O senhor esteve no Simpósio Internacional Linguístico-Ortográfico da Língua Portuguesa, realizado recentemente em Brasília (nos dias 10, 11 e 12 de setembro)? portugues em pautaO senhor apresentou uma proposta de revisão do Acordo Ortográfico de 1990? Em que ela consiste? Deonísio da Silva – Sim, estive no simpósio, que teve seu herói, o escritor José Carlos Gentili, que do nada tirou aquele evento. Para fazer jus ao convite, preparei um “paper”. O título foi “A Extinção do Hífen”, mas não o apresentei porque notei certo enfado dos presentes com a repetição de questões de complexas sutilezas, cuja explicação é inútil, apesar da alta qualificação dos conferencistas. Fiz, então, da etimologia a referência solar de minha intervenção, ilustrando com exemplos concretos o quanto perderíamos se adotássemos uma escrita fonética, de resto impossível de ser sequer formulada, quanto mais aplicada. Copo é copo, e leite é leite, mas “copo de leite” designa um copo com leite, porém “copo-de-leite” [com hifens] designa a açucena, uma planta ornamental. “Copo” e “leite” vieram ambos do latim, respectivamente de “cuppa” e de “lacte”; açucena veio do árabe “as-susana”, designando o que o grego conhecia por “leírion”, que deu “lilium” em latim e “lírio” em português. Essas questões etimológicas tornam-se ainda mais esclarecedoras no caso dos fármacos, em que a mudança de uma letra, não apenas da dosagem, pode designar remédio ou veneno. Além do mais, sou de Santa Catarina e lá se pronuncia “leite” de um modo diferente do que ouvi por longos anos no Rio Grande do Sul, no Paraná e em São Paulo, estados onde morei por vários anos. E no Rio, onde vivo há 11 anos, a pronúncia tem outras variações. Minha crítica foi esta: o Acordo ouviu muito pouca gente! Não me refiro a plebiscitos, mas acredito que profissionais da língua, como aqueles que, como eu, a estudam e a explicam a alunos ou a leitores, devam ser ouvidos. Essa foi a minha proposta. Como é que pode o nosso amigo Evanildo Bechara ser o executor das medidas de emergência do Acordo? Ele é altamente qualificado, é uma honra ser colega dele na Academia Brasileira de Filologia, mas ele precisa consultar, por exemplo, os colegas das duas Academias: da ABL e da ABRAFIL! Pelo menos esses! TN – Há alguma proposta de revisão do Acordo formalizada, além da sua, em condições de ser discutida no âmbito do Senado? DS – Creio que ainda não, mas achei bom o Senado estar envolvido nisso. TN – A quem caberá liderar essa discussão no Senado e como exatamente se definirão as novas regras, na hipótese de isso vir a acontecer? Há um conselho de pessoas especializadas? DS – Se houver uma proposta, ela deverá ser formulada por quem entende do riscado. O brasileiro tem uma habilidade verbal impressionante, mas estuda pouco a sua língua. É bom que seus representantes no Senado examinem esta questão. Alguns dos que têm determinado como devemos escrever deveriam usar tornozeleiras eletrônicas para sabermos por onde andam e por que formulam tantas impropriedades. Não é o caso de Ernani Pimentel. Ele detectou certa hostilidade em minhas críticas, mas eu não critico pessoas. Critico instituições. E elas, apesar de conduzidas por pessoas, também moldam aqueles que as conduzem. TN – A quem exatamente o senhor se refere? DS – Por exemplo: recentemente, o dinheiro público financiou uma edição de 600 mil exemplares de “O Alienista”, de Machado de Assis, em que, em vez de serem explicadas as palavras que ampliavam e melhoravam o vocabulário dos leitores, principalmente alunos, elas eram substituídas por outras, tidas por mais fáceis, resultando em edição falsificada de nosso maior escritor, paga com dinheiro público! Ora, todos sabemos que o autor é modelo de escrever bem. TN – Novamente a ideia de que é preciso “simplificar” as coisas. Penso que seria mais produtivo ensinar mais e melhor, fomentar a leitura e despertar o interesse pela nossa literatura. Mas, ainda sobre as possíveis mudanças ortográficas, o senhor acredita que um GTT [grupo de trabalho técnico, criado pela Comissão de Educação do Senado] coordenado por alguém que está fora do meio acadêmico vai conseguir congregar professores e estudiosos das universidades para debater o tema? DS – Não vai. O meio acadêmico trabalha sobre credenciais, vitae, competência, desempenho, aferidos trienalmente por suas publicações, palestras, conferências etc., de acordo com a Plataforma Lattes, do CNPQ. TN – O senhor percebeu alguma intenção desse GTT de levar o debate aos especialistas que estão nas universidades? O Senado, ao criar o GTT, não deveria ter buscado a universidade? DS - “Pau que nasce torto, nunca se endireita”, como diz o Melô do Tchan, e “menina que requebra… mãe, pega na cabeça”. O GTT – ele existe? – começou mal e pode terminar pior. “Depois de nove meses você vê o resultado”. Vai nascer um monstrinho. TN – O senhor acha que o GTT vai realmente propor alguma mudança ou o papel desse grupo é apenas levantar a questão? DS – Soube que o Senado vai fazer uma audiência pública sobre o tema. Parece uma boa coisa, mas eu tenho minhas dúvidas sobre se vale a pena e se este é o melhor caminho. Temo que entre os interessados haja gente interessada em outra coisa. Por exemplo: ganhar dinheiro com publicações apressadas, incluindo fazer dicionários com verbetes errados, como fizeram quando da “decretação” do Acordo. TN – O senhor acredita que haja intenção por parte da própria ABL de propor algum tipo de alteração no Acordo ou no Volp [Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa]? DS – Eu me esforço para acreditar que haja, mas estou muito desconfiado de que não seja assim! Ademais, a ABL não é sequer a instituição mais indicada para fazer isso. Examinemos os “vitae” de cada um dos acadêmicos. Quem ali pode fazer isso? Poucos. Acho que há excluídos até mesmo no interior da ABL, quanto mais fora! Os responsáveis pelo Acordo não podem desprezar os centros universitários de excelência onde a língua portuguesa é pesquisada e ensinada. TN – Que críticas o senhor faz ao texto do Acordo Ortográfico e/ou à interpretação que a ABL fez dele? DS – A principal é não terem consultado mais gente. “In medio virtus”, como ensinaram os sábios romanos. Não era necessário fazer plebiscito sobre os temas, mas tampouco era necessário tratar o Acordo como obra de “illuminati”. Ainda mais que pesam tantas controvérsias sobre se são tão “illuminati” assim. TN – O senhor acredita que qualquer pessoa, independentemente da formação acadêmica, possa propor um novo sistema ortográfico? DS – Não! Se eu não acreditasse na relação bunda-cadeira-hora, não teria estudado tanto! Quando um técnico de informática vem resolver um problema em meu computador, não lhe pergunto se ele sabe quais as mais de 21 mil palavras com hífen que sofreram alterações no português com o Acordo. E espero que ele não me pergunte se eu sei as sutis diferenças entre um “software” e um “hardware”. Dele espero que entenda de computador. Se as pessoas que inventaram computadores, celulares e “smartphones” escrevessem como seus usuários escrevem nesses utensílios, estaríamos na idade do “chip” lascado… TN – Na sua avaliação, o Acordo Ortográfico de 1990 era necessário? Fazer a reforma desse Acordo vale a pena? DS – Se você está passando mal e não sabe o que tem, é melhor procurar um médico no qual confie. O português estava passando bem e, ainda assim, resolveram medicá-lo e, mais do que isso, submetê-lo a intervenções cirúrgicas dispensáveis. A verdade é que não precisávamos deste Acordo. Unificar modos de escrever, como fez o árabe, que tinha 14 grafias e agora tem uma apenas, para efeito internacional, respeitando a variação de cada país, tudo bem. Mas impor, não! Fala-se em Acordo com as outras nações lusófonas. Certo! Mas antes é preciso fazer o Acordo com os brasileiros. Esta proposta de refazê-lo é pior ainda. Este coelho não saiu do mato. Saiu de alguma cartola. TN – O professor Ernani Pimentel, coordenador do GTT, apresenta em seu site uma proposta de ortografia fonética que chegou a ser divulgada por vários veículos de comunicação. Após a divulgação, as reportagens foram desmentidas pela Agência Senado, mas o desmentido foi baseado apenas no fato de que tal proposta não estaria “formalizada”. O senhor acha que os senadores que criaram o GTT conhecem, de fato, essa proposta? Cristóvão Buarque aparece no site do prof. Ernani Pimentel ao lado de declaração favorável a ela. DS – Tenho grande apreço pelo senador Cristóvão Buarque, aliás, um bom romancista, mas esta parte de sua biografia é sempre esquecida. E sempre tenho sido um defensor intransigente de parlamentos, por piores que sejam, pois nos representam. Se o jabuti está no galho da árvore, alguém o pôs lá. Então, se são aqueles os nossos representantes, foi o povo quem os pôs lá. E livremente. Mas senadores podem ser enganados por espertos, por desavisados, por quem não tem maldade, mas prejudica mais do que se tivesse… Sem contar que os senadores não são santos. Enfim, todo cuidado é pouco quando se mexe no patrimônio público. E a língua é isso: um patrimônio do povo brasileiro.

sábado, 4 de outubro de 2014

O FUTURO NÃO ABRE A PORTA ANTES DA HORA

Por que eu perderia para um bêbado, um cotó e um aleijado?”. Fevereiro de 1942. Adolf Hitler, então com 52 anos, era vegetariano, não fumava, estava com saúde de ferro e se referia aos líderes das três grandes potências que enfrentavam a Alemanha na Segunda Guerra Mundial. O bêbado era Winston Leonard Spencer-Churchill, de 68 anos, primeiro-ministro inglês, carnívoro que bebia, fumava e posava para fotos de charuto aceso.
Com o braço esquerdo mais curto do que o direito por causa de um ferimento ocorrido em seus verdes anos, comendo, bebendo e fumando muito, o cotó era o georgiano Iossif Vissarionovitch Djugatchvli, mais conhecido por Josef Stalin, de 63 anos, supremo comandante da Rússia, depois União Soviética. O aleijado era o presidente dos EUA, o norte-americano Franklin Delano Roosevelt, de 60 anos, que usava cadeira de rodas ou era carregado por assessores por causa de uma poliomielite contraída aos 39 anos
Quando a famosa frase foi proferida, já fazia três anos que Hitler assustava o mundo inteiro com suas vitórias retumbantes. Naquele mesmo mês, aliás, vivendo refugiado em Petrópolis, no Rio, o escritor judeu-austríaco Stefan Zweig morria em companhia de sua amada Lotte, num duplo suicídio que sempre me pareceu duplo assassinato. Hoje é dia de eleições presidenciais. Os institutos de pesquisa anunciam um dom que não têm, o da profecia. Já erraram feio outras vezes. No dia da eleição de Harry Truman, o presidente dos EUA que acabou com a Segunda Guerra Mundial, a manchete de alguns jornais foi: “Dewey defeats Truman” (Dewey derrota Truman).
Ora, direis, isso foi em 1948 e nos EUA. Mas no Brasil de 2014 estão no poder vários governadores que, segundo pesquisas feitas às vésperas de sua eleição, em 2010, nem iriam para o segundo turno. Portanto, neste domingo, votemos. E aguardemos. Como no futebol, o jogo só termina quando o juiz dá o apito final. Sim, este jogo cívico também tem juiz! º da Academia Brasileira de Filologia, professor e escritor, colunista da Rádio Bandnews (RJ) e diretor-adjunto da Editora da Unisul (SC).

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

ORIGEM DA EXPRESSÃO PAPAGAIO DE PIRATA E ELEIÇÕES

Hoje, 01/10/2014,na Rádio BandNews FM, no SEM PAPAS NA LÍNGUA, com Ricardo Boechat, Rodolfo Schneider e Maíra Gama Martins, lembramos que nosso presidente Boechat ganhou mais uma vez o Prêmio Comunique-se de Jornalismo (é decampeão nas categorias disputadas). Tratamos da origem da expressão "papagaio de pirata", inspirada em garrafa de rum, o "Ron Montilla", que mostra um pirata com um papagaio no ombro.
Demos a origem de candidato (candidatus, que vestia uma toga branca na antiga Roma, simbolizando pureza, ausência de mácula, mancha), voto (do Latim votum, promessa), urna (do Latim urna, vaso), e de ostracismo, palavra que tem origem na concha de ostra, que servia de cédula na Grécia antiga para banir alguém indesejado. E mais umas coisinhas, que serão postadas depois no Youtube, como a famosa historinha entre Jânio Quadros, já exilado em Paris, conversando com um transeunte que lhe perguntou se o ex-presidente sabia quem era ele, e Jânio respondeu assim: " Ora, meu caro, se você, que é você, não sabe quem você é, como iria eu sabê-lo?". E Boechat contou outra: "Que você faz, meu caro eleitor?". "Sou funcionário dos correios, presidente". "E gosta de sê-lo?". "Não. Não coleciono, presidente". Ele entendeu "selo".

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

106 ANOS DA MORTE DE MACHADO DE ASSIS NA RÁDIO BANDNEWS FM 94,90

Com Pollyanna Bretas, hoje na Rádio Bandnews FM 94,90, no PITADAS DO DEONÍSIO Há 106 anos, nesse dia, 29/9/1908, às 3h30 da madrugada morria, de câncer na boca, na Rua Cosme Velho, 18, o maior escritor brasileiro de todos os tempos, Joaquim Maria Machado de Assis. Preto (num país escravocrata!), pobre, órfão, gago, epiléptico, sem curso superior e sem jamais ter-se formado em coisa nenhuma, casado com uma portuguesa mais velha do que ele, que partira quatro anos antes, Machado morreu sem filhos para não transmitir a epilepsia. 2) Sua grande figura de linguagem foi a ironia, palavra de origem grega, que veio do Latim para o Português, e significa "perguntar fingindo ignorância, mostrar o avesso para que se veja o direito, dizer o contrário do que se está pensando". 3) Eis belo exemplo da IRONIA de Machado ao tratar da Abolição da Escravatura em crônica publicada alguns dias depois: "Houve sol, e grande sol, naquele domingo de 1888, em que o Senado votou a lei, que a regente ( a princesa Isabel) sancionou, e todos saímos à rua. Sim, também eu saí à rua, eu o mais encolhido dos caramujos, também eu entrei no préstito, em carruagem aberta (...) Verdadeiramente, foi o único dia de delírio que me lembra ter visto." Se fosse hoje, a lei não seria votada. Os parlamentares trabalham de terça a quinta-feira... 4) Depois, em outra crônica, ele conta a história de um patrão que alforria seu escravo, um moleque chamado Pancrácio, ANTES da ABOLIÇÃO. E faz um jantar para entregar-lhe a Carta de Alforria. No outro dia, pergunta se o escravo, agora liberto, quer ir embora ou ficar. Oferece seis contos por ano e ele fica. Mas sem casa, comida e sem roupa lavada. Isto é, vai ganhar menos do que antes. E no dia seguinte apanha do patrão, com o fim de não ser abolido o costume... 5) Outros escritores também debocharam da Lei. Aluísio Azevedo, no final de O Cortiço, mostra João Romão recebendo uma comissão de abolicionistas que vêm homenageá-lo em casa. Momentos antes, sua escrava e amante, Bertoleza, se sucidara na cozinha, ao saber que a carta de alforria pela qual pagara com o trabalho gratuito de muitos anos, era falsa!

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

O PRIMEIRO JORNAL DO MUNDO

“Uma briga num bar é mais importante do que uma revolução no Chile”, dizia o fundador do Jornal do Poste, ainda hoje afixado nos muros de São João del Rey, uma espécie de Macondo das Minas Gerais. O Jornal do Poste ainda existe e chega a ter três edições diárias. Seu fundador foi João Lobosque Neto, o Joanino, fiscal da Receita e proprietário de um boteco. Nas sextas-feiras, quando o pessoal do interior vinha fazer compras, o texto era mais simples. A briga, não de bar, mas de taverna, não era importante para os antigos romanos. Importantes eram as batalhas travadas por Júlio César na Gália, atual França, de onde voltou com retumbantes vitórias, o rei Vercingetórix preso numa gaiola e uma obra literária referencial, “De Bello Gallico”, A Guerra Gaulesa. E ainda atravessou a rio Rubicão pronunciando a frase famosa “Alea jacta est” (A sorte foi lançada). Foi obra dos antigos romanos o primeiro jornal do mundo, o ACTA DIURNA POPULI ROMANI (atos diários do povo de Roma). Eram afixados diariamente no Fórum para que as pessoas pudessem saber o que estava acontecendo. No começo eram publicados apenas editais, mas depois começaram a ser noticiados também casamentos, nascimentos, avisos fúnebres e outras notícias. Além das “Acta Diurna”, havia também os “Annales” (anais), com o registro das grandes batalhas e das conquistas de novos territórios, e as “Acta Publica”, cujo tema era o comércio. As três publicações romanas estavam sob controle republicano. O que mudou? Patrícia Poeta foi demitida do Jornal Nacional, depois de pôr o dedo na cara da presidente da República! “Isso não se faz, Arnesta, nós não se importa, mas você você devia ter deixado recado na porta”, não na cara da presidente que é de todos nós, afinal o povo a elegeu. E talvez a eleja de novo. E aí, como fica? A mídia mudou pouco nesses dois milênios. O que mais mudou foi a tecnologia. º da Academia Brasileira de Filologia, professor e escritor, colunista da Rádio Bandnews (RJ) e diretor-adjunto da Editora da Unisul (SC).

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

ARQUIDUQUESA DA ÁUSTRIA MORREU POBRE NO SUL

A arquiduquesa Maria Antonia da Áustria, da mesma estirpe da princesa Leopoldina, esposa de Dom Pedro I, e de Sissi, a imperatriz, vivia de recolher sobras de restaurantes do Mercado Público, em Porto Alegre (RS), quando morreu, aos 78 anos, em 1977. Sua vida começara em Zagreb, hoje capital da Croácia, onde nascera em 1899. Quando eu fazia o mestrado na UFGRS, encontrava vários amigos nos mesmos lugares por onde andava a arquiduquesa, nos arredores da Rua da Praia, cujo nome guarda a memória das águas do Rio Guaíba que um dia a banharam: o promotor de Justiça e poeta Carlos Verzoni Nejar, hoje da Academia Brasileira de Letras; o poeta Mário Quintana; o romancista Josué Guimarães; os professores Guilhermino César, Sergius Gonzaga, Voltaire Schilling, Joaquim José Felizardo. Nós nada sabíamos dela. Mas havia alguém que sabia e tinha sido seu colega de pensão na década de 50. Era um menino que tinha vindo de Antônio Prado (RS) para estudar no prestigioso Colégio Júlio de Castilhos. O menino tornou-se piloto da VARIG, depois formou-se em Medicina e hoje é também um escritor dos bons. Seu nome: Franklin Cunha. Na pensão de Abel e Júlia Rubinatto, no número 980 da Avenida Independência, onde hoje está um Banco, teve como vizinhos de quarto a arquiduquesa da Áustria e seu último marido, Don Luis Fernando Perez Sucre. Ela o desposara em 1942, no Uruguai, para onde, já viúva, emigrara com os cinco filhos de sobrenomes Orlandis (do pai) y Habsburgo (da mãe). Há aqueles que pensam que a riqueza, a fortuna e o dinheiro não têm fim. O viés etimológico de Fortuna, que era uma das deusas da antiga Roma, presidindo ao bem e ao mal, já nos deixa desconfiados de que as fronteiras da sorte e do azar são móveis. Fortuna tem o mesmo étimo de forte, conforto, desconforto, fortuito e infortúnio, entre outras palavras. PS. Mais no livro de Franklin Cunha, Uma arquiduquesa imperial entre nós. Porto Alegre, Editora Pradense, 2013. º da Academia Brasileira de Filologia, professor e escritor, colunista da Rádio Bandnews (RJ) e diretor-adjunto da Editora da Unisul (SC).

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

MUDANÇAS NA LÍNGUA PORTUGUESA

Na semana passada, realizou-se em Brasília o Simpósio Internacional Linguístico-ortográfico da língua Portuguesa, para o qual foram enviados representantes das oito nações lusófonas, isto é, que têm como oficial o idioma português. São elas: Portugal, Brasil, Angola, Moçambique, Cabo Verde, São Tomé & Príncipe, Guiné-Bissau e Timor Leste. A língua portuguesa, a 5ª mais falada hoje no mundo, é o idioma oficial de países onde vivem 260 milhões de pessoas. Mas que escrevem de dois modos diferentes, um caso único no mundo. Foram tomadas iniciativas para unificar em 1911, 1943, 1945, 1971 e 1990. Ora, o Acordo Ortográfico de 1990 já tem 24 anos e ainda não foi implementado em todas essas nações. No Brasil, este novo modo de escrever está sendo aplicado desde 2009, mas com autorização para conviver com a antiga forma até 2016, a pedido de Portugal, depois de negociações entre o Senado brasileiro e a presidente Dilma Rousseff. Não faz tanto tempo assim que pharmacia, theatro, chlorophylla, exgottar, phosphoro, sciencia, football, maillot, soutien, rheumatismo, aucthor e damno, depois simplificados para farmácia, teatro, clorofila, esgotar, fósforo, ciência, futebol, maiô, sutiã, reumatismo, autor e dano. A língua portuguesa estava em uso há quase meio milênio quando Duarte Nunes de Leão, em 1576, propôs a primeira tentativa de conciliar a etimologia e a fonética para fixar a “Orthographia da Lingoa Portugueza”. Do século XIII ao século XVI predominara uma ortografia fonética, isto é, o objetivo era escrever o mais próximo do modo como se fala. Do século XVI ao século XX, houve uma conciliação entre a fonética e a etimologia, o que também se tenta fazer agora, mas com várias mudanças, principalmente no hífen. O título de minha conferência foi “A Extinção do Hífen”. Na semana que vem, contarei mais. (xx) º da Academia Brasileira de Filologia, professor e escritor, colunista da Rádio Bandnews (RJ) e diretor-adjunto da Editora da Unisul (SC).

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

A INDEPENDÊNCIA E O IDIOMA

http://oglobo.globo.com/opiniao/a-independencia-o-idioma-13897201 Se não abrir o site do Globo, eis o artigo aqui: A INDEPENDÊNCIA E O IDIOMA Deonísio da Silva * Foi de Pombal o discernimento de dotar o Brasil de uma língua comum, uma vez que os padres ensinavam outras, de acordo com a nacionalidade das ordens religiosas Quando, no dia 7 de setembro de 1822, por volta das quatro horas da tarde, dom Pedro I proclamou em São Paulo, às margens do Riacho Ipiranga, a independência do Brasil, a jovem nação já tinha uma língua, a portuguesa. Esta questão não é irrelevante. Uma nação se faz mais por sua língua do que por seu território. Estão aí de exemplo os judeus, sem pátria durante milênios, mas não sem língua. O hebraico, em que foi escrito o Pentateuco (a Torá), foi a língua que conservou unido o povo do livro. Dom Pedro, nascido em 1798, não conheceu o Marquês de Pombal, falecido em 1782, aos 83 anos. Mas deve muito a ele. Foi ele quem modernizou Portugal e seus domínios de além-mar no século anterior ao da Independência. E foi de Pombal o discernimento de dotar o Brasil de uma língua comum, a portuguesa, uma vez que os padres letrados usavam e ensinavam outras, de acordo com a nacionalidade das respectivas ordens religiosas. Dom João VI, pai de Dom Pedro I, tinha 15 anos quando Pombal morreu. Deve ter aprendido alguma coisa com o poderoso ministro do vovô, dom José I, pois foi o único que enganou Napoleão, quando, príncipe regente, fugiu com toda a Família Real para o Brasil, em 1807. Dali a 15 anos, Dom Pedro I, ao proclamar a Independência, seguiu o sábio conselho do pai, dado na manhã de 26 de abril de 1821, abraçado ao filho, já embarcado para voltar a contragosto para Portugal. Muito inteligente, o pai antevia a independência e disse ao filho: “Pedro, põe a coroa na tua cabeça antes que algum aventureiro lance mão dela.” O português, falado por 260 milhões, dos quais 200 milhões são brasileiros, é hoje a quinta língua mais falada no mundo, atrás do hindu, do mandarim, do inglês e do espanhol. Já temos a língua falada, falta conquistarmos a língua escrita para consolidarmos nossa independência. E esta questão é tão ou mais importante do que outras, como a econômica, a política e a social. Deonísio da Silva é escritor e professor A Independência e o idioma Foi de Pombal o discernimento de dotar o Brasil de uma língua comum, uma vez que os padres ensinavam outras, de acordo com a nacionalidade das ordens religiosas OGLOBO.GLOBO.COM