NOME DE POBRE NO BRASIL

sexta-feira, 31 de maio de 2013

NÃO FOI INRI QUE ESCREVERAM NA CRUZ

O Império Romano mandava escrever na cruz dos condenados o nome do réu e o motivo da pena de morte. No caso de Jesus, a tradição sempre informou que a explicação estava resumida no acrônimo INRI, como vemos nos crucifixos. Mas o Evangelho de São João 19,19 informa que a frase foi colocada completa, sem abreviação ou acrônimo algum: “Pilatos mandou escrever e colocar na cruz esta inscrição: Jesus, Nazareno, Rei dos Judeus”. “Estava escrita em hebraico, em latim e em grego”. Narrações históricas e lendárias informam que Santa Helena, mãe de Constantino, que no século IV tornou o cristianismo a religião oficial do império romano, liderou a expedição que encontrou a cruz em que Jesus foi crucificado, repartiu-a em três partes, mandando um pedaço para cada uma das três igrejas construídas especialmente para guardar o precioso tesouro: em Jerusalém, em Roma e em Constantinopla. Erros de tradução contribuíram para que essa história fosse dada como invenção, mas inventio em Latim significa descoberta. Então, ela não inventou essa história, ela descobriu a cruz, os pregos e a tabuleta nas escavações que mandou fazer no monte que em Hebraico era chamado Gólgotha, em Aramaico Gûlgaltâ, em Grego Kraniou topos, e em Latim Calvarium. Nas quatro línguas, o significado era o mesmo: lugar das caveiras. Era naquela pequena elevação, nos arredores de Jerusalém, que os condenados à morte eram crucificados. O romanos chamavam a tabuleta de titulus, cujo significado era título, inscrição. E o que ali estava escrito era chamado elogium, que no Português elogio conservou apenas um significado positivo. No Latim designa identificação, podendo ser de nobreza ou não. Era semelhante ao Grego epitáhion, epitaphium em Latim e epitáfio em Português. Em túmulos antigos, o epitáfio trazia versos enaltecendo as virtudes de quem ali estava enterrado, mas às vezes eram versos satíricos que debochavam de alguma característica ou defeito do falecido. Os romanos enterravam ou incineravam os mortos, dando origem à palavra busto, de bustum, queimado, do mesmo étimo de combustão. Isto porque, no lugar em que o morto era queimado, erguia-se um pedestal onde era posta a sua imagem em bronze. Há outras curiosidades no elogium, a escrita do titulus, a tabuleta posta na cruz do Senhor. Como no Hebraico a frase é escrita da direita para a esquerda, o copista, a mando de Pilatos, escreveu as traduções em Grego e em Latim, também da direita para a esquerda, mas nessas duas línguas, como no Português, é da esquerda para a direita que se escreve. Pilatos exigiu também que a frase latina ficasse perto da cabeça do condenado. Assim, a hebraica ficou no alto, e a grega no meio das duas. A Palestina, palco dos trágicos eventos, era então poliglota. No comércio, usava-se o Grego. Nos documentos, predominava o Latim. No templo, o Hebraico. E na vida quotidiana, o Aramaico, língua em que Jesus ensinava aos contemporâneos. Aonde nos leva essa fascinante história das palavras! (xx)

sexta-feira, 24 de maio de 2013

QUATRO SANT`ANNAS E AÉCIO NEVES

Na semana passada, todo o Brasil parou para saber qual era a nova seleção brasileira. O técnico Luís Felipe Scolari, o Filipão, estava onipresente em toda a mídia. Apareceu mais do que o senador e ex-governador de Minas Gerais, Aécio Neves, lançado pré-candidato à presidência da República. Por enquanto, ele ainda não empolgou tanto o público quanto Filipão. Empolgar é um verbo curioso. Estávamos acostumados a usá-lo para designar entusiasmo, palavra que tem Deus no meio, o Grego Theos, presente mais explicitamente em teologia. O étimo indica que o entusiasmado se anima, isto é, move a alma, porque está tomado por centelha divina. A memória tem suas armadilhas. Não nos esqueçamos dos tremendos sustos, historicamente ainda recentes, como o das bombas que iam ser explodidas no meio de uma multidão de 18 000 jovens, no Riocentro, no Rio. Era o dia 30 de abril de 1981 e eles estavam num show em homenagem ao Dia do Trabalho. O então coronel Job Lorena de Sant´Anna atribuiu à esquerda o projeto de atentado e disse que o sargento Guilherme Pereira do Rosário, que morrera com uma das bombas no colo, dentro de um Puma dirigido pelo capitão Wilson Luiz Carlos Chaves Machado, tinha empolgado aquela bomba... Empolgado? Os jornalistas precisaram ir aos dicionários para atestar o insólito sentido da palavra invocada pelo coronel nas suas explicações. E sabem do que mais? Quem socorreu e levou o capitão do Exército ao hospital foi Andréa Neves, irmã de Aécio Neves, ambos netos de Tancredo Neves, aquele que, como a viúva Porcina, foi sem nunca ter sido, pois que, eleito presidente da República, morreu no hospital às vésperas da posse, no dia 21 de abril de 1985. Enquanto terroristas fardados tentavam abortar a redemocratização, Telê Sant´Anna, o segundo Sant´Anna do contexto, formava uma das mais lindas seleções brasileiras de todos os tempos, mas que, como não ganhou nada, perdeu-se no dia de outra tragédia, a do Estádio Sarriá, em Barcelona, na Copa do Mundo de 1982, realizada na Espanha, quando, tendo o melhor time da competição, o Brasil perdeu para a Itália por 3 x 2. O terceiro Sant´Anna é o poeta Affonso Romano de Sant´Anna, que marcou aqueles anos com estes belos versos sobre a mentira: “Mentiram-me. Mentiram-me ontem/ e hoje mentem novamente. Mentem/ de corpo e alma, completamente./ E mentem de maneira tão pungente/ que acho que mentem sinceramente.”. Política e futebol têm muito em comum, inclusive conchavos que ninguém entende. O ex-craque Romário, hoje deputado federal, disse que CBF é sigla de Confederação Brasileira de Falcatruas. O jeito é lutar, como dizia outro mineiro (poxa, minha crônica está repleta de mineiros hoje...), Carlos Drummond de Andrade. “Lutar com palavras/ É a luta mais vã./ Entanto Lutamos/ Mal rompe a manhã”. E, de reforço, fazer uma prece a Sant´Anna, mulher de São Joaquim, sogra de São José, avó de Jesus, filho de Maria. A Sagrada Família não pratica nepotismo. Todos podem pedir o que quiserem. Peçamos que nosso povo não perca a memória! (xx)

segunda-feira, 20 de maio de 2013

FIM DO BOLSA FAMÍLIA: FATO OU BOATO?

O Globo informa à p.2 de hoje (comentando a correria de multidões rumo a agências da Caixa Econômica Federal para fazer o último saque do Bolsa Família) que "o boato é falso, e o programa continuará". Até aí morreu o Neves, e o Conselheiro Acácio já sabia da coscuvilhice, pois TODO BOATO É FALSO. Quando confirmado, deixa de ser boato e se transforma em NOTÍCIA. Portanto, boato é uma notícia falsa. Mestre Celso Luft, ex-irmão marista, é mais piedoso: "Como a tendência semântica é boato= ´notícia infundada´, as combinações ´boato verdadeiro´ e ´boato falso´ vão sendo evitadas". O AULETE é implacável: "sm. 1 História ou notícia que se divulga sobre alguém ou algo, sem que se confirme sua origem ou veracidade; RUMOR: "Surdo boato, dos que por aí irrompem e se alastram, sem que se saiba de onde partem..." (Euclides da Cunha, Confrontos e contrastes) [Cf.: boato (v. boatar).] 2 Notícia ou informação sem qualquer fundamento: Não acredite nisso, é boato. [F.: Do lat. boatus. Hom./Par.: boato (sm.), boato (fl. de boatar).]". Digo eu em DE ONDE VÊM AS PALAVRAS (17a edição, no prelo): "BOATO: do Latim ´boatus´, berro do boi, grito, alvoroço. Passou a designar a notícia falsa, anônima, sem fonte assumida. Entretanto, quando o boato chega aos ouvidos de um jornalista, é de praxe a pesquisa, que pode confirmar ou negar os rumores. Durante a ditadura militar, quando havia censura à imprensa, notícias verdadeiras foram atribuídas a boatos". Pois é! A pesquisa! Foi o que faltou!

domingo, 19 de maio de 2013

ANA KARENINA: AUTOR, LIVRO E FILME

Aproveitando que o filme "Ana Karenina", baseado no romance homônimo de Leon Tolstoi, está nas telonas, eis uma foto do autor, em 1909, contando histórias para os netos. E ii cartaz de uma das versões do livro no cinema.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

O CANSAÇO DE UM DEPUTADO FEDERAL

Sexta-feira, 17 de maio, 6h da manhã. Como faço todos os dias, pego o jornal. O cheiro bom do café, a música da Rádio Mec e uma calopsita me fazem companhia. Michele, minha companheira, acordará mais tarde. A foto da primeira página mostra um professor e um médico dormindo. Vestem terno e gravata esses dois e estão cansadíssimos. Mas o professor não está na sala de aula, e o médico não está atendendo no consultório ou no hospital. São deputados federais e foram fotografados durante a mais longa sessão do Congresso, que aprovou a Medida Provisória dos Portos. O professor é Professor Sétimo, deputado federal pelo PMDB do Maranhão. O médico é Darcísio Perondi, deputado federal pelo PMDB do Rio Grande do Sul. Não conheço Professor Sétimo. Nada sei dele, a não ser que é deputado federal pelo Maranhão. O outro entretanto é meu velho conhecido. Darcísio Perondi foi pediatra de nossa filha, em Ijuí (RS). Penso que Soila e eu seremos eternamente gratos àquele médico extraordinário, atencioso, que atendia tão bem àqueles então marinheiros de primeira viagem, que pouco entendiam do dia a dia da filha. Passamos por momentos de muita apreensão naqueles primeiros meses e ele era sempre encontrado. E, chamado, ia à nossa casa. E sempre resolveu os problemas médicos que lhe eram apresentados por pais recolutas. Ele também era jovem como nós e também estreava na profissão. Temos fotos de alguns desses momentos memoráveis. Vemos as fotos nos jornais, não vemos o contexto de onde saíram. Penso que atrás de cada foto há, cá para nós, uma vontade de mostrar que os deputados federais não trabalham e que, uma vez chamados, dormem no serviço. Abaixo, ainda na primeira página, mais dois dormindo: o deputado federal Roberto Policarpo, do PT do Distrito Federal, e a deputada federal Luciana Santos , do PCdoB de Pernambuco. São outros dois dos quais nada sei, a não ser que todos eles juntos legislam por todos os brasileiros, por aqueles que votaram neles e por aqueles que não votaram. Por aqueles que os conhecem e por aqueles que não os conhecem. Eles estão ali porque nos representam. Volto ao deputado que eu conheço. Darcísio Perondi não estava em Brasília quando, ano passado, eu lá estive para a Feira Internacional do Livro, e para falar de meu romance Lotte & Zweig. E também fazer uma palestra no TRF, esta em parceria de outro amigo, José Renato Nalini, Corregedor-geral da Justiça de São Paulo. Regina Perondi, esposa de Darcísio, e o filho de ambos, Bernardo, estavam em Brasília nessa ocasião e conversamos um pouco. Mandei a meu amigo um abraço e aguardei que nos encontrássemos em eventual outra vez. Conheci Regina quando ela trabalhava no Jornal da Manhã, em Ijuí, e eu escrevia no Correio Serrano. Era prefeito o irmão de Darcísio, Emídio Perondi. Ambos são tios de Dunga, atual técnico do Internacional. O prefeito Emídio fazia questão de apoiar os lançamentos de meus primeiros livros. Comparecia e levava muita gente. O que não faz uma foto! Esta me encheu de boas lembranças! (xx)

terça-feira, 14 de maio de 2013

CABARÉ PROCESSA IGREJA NO CEARÁ: SÓ NO BRASIL!

Em Aquiraz, no Ceará, dona Tarcília Bezerra construiu uma expansão de seu cabaré, cujas atividades estavam em constante crescimento após a criação de seguro desemprego para pescadores e vários outros tipos de bolsas. Em resposta, uma dessas seitas populares, em templo sempre lotado, iniciou uma forte campanha para bloquear a expansão, com sessões de oração em sua igreja, de manhã, à tarde e à noite. O trabalho de ampliação e reforma progredia célere até uma semana antes da reinauguração, quando um raio atingiu o cabaré queimando as instalações elétricas e provocando um incêndio que destruiu o telhado e grande parte da construção. Após a destruição do cabaré, o pastor e os crentes da igreja passaram a se gabar "do grande poder da oração". Então, Tarcília Bezerra (de cujo sobrenome o pastor fez questão de dar o sinônimo, vaca pequena) processou a igreja, o pastor e toda a congregação, com o fundamento de que eles "foram os responsáveis pelo fim de seu prédio e de seu negócio" utilizando-se da intervenção divina, direta ou indireta e das ações ou meios.” Na sua resposta à ação judicial, a igreja, veementemente, negou toda e qualquer responsabilidade ou qualquer ligação com o fim do edifício. O juiz a quem o processo foi submetido leu a reclamação da autora e a resposta dos réus e, na audiência de abertura, comentou: - Eu não sei como vou decidir neste caso, mas uma coisa está patente nos autos: temos aqui uma proprietária de um cabaré que firmemente acredita no poder das orações e uma igreja inteira declarando que as orações não valem nada!.

GENTE E SARDINHA EM LATA

Pescadores da Sardenha,, na Itália, passaram a vender sardinhas em latas, com óleo ou molhos. Os peixes grudavam uns nos outros. A imagem serviu para dizer-se que as pessoas aglomeradas em ônibus e em outros meios de transportes públicos, especialmente o metrô, viajam como sardinha em lata.

domingo, 12 de maio de 2013

VICE-REITOR: AGORA SOU EX (CONTINUO DIRETOR DA TV ESTÁCIO E DIRETOR DE RELAÇÕES INSTITUCIONAIS)

(Revi o texto anterior, acrescentando alguns parágrafos, sugeridos por amigos). Mutatis mutandis, não é outro o caminho! Alguns o fazem chutatis chutandi. Não, nós, professores! Nós temos todo o cuidado do mundo com o único bem que não pode ser saqueado: nossos saberes. Alguém pode se dar muito bem e ficar rico do dia para a noite, em curto prazo. Mas continuará a ser o que sempre foi. E se é ignorante, néscio permanecerá. O saber é obra para a qual a vida inteira é insuficiente. Muita gente me pergunta o que vou fazer na Estácio doravante. Por isso, como sempre tenho sido uma das vozes da Estácio na mídia, com presença frequente por força de projetos de domínio conexo entre meus ofícios de professor e escritor, resolvi publicar essas linhas a quem interessar possa. Antecipo neste resumo que meu convívio na Casa é motivo para que desempenhe meu trabalho com alegria na Estácio, onde tenho bons amigos entre diretores, professores, alunos e funcionários. Nosso ambiente de trabalho e é bom e enseja que vivamos em plenitude a frase que um dia vi, em Francês (Je ne fais rien san gaieté) à porta da famosa Biblioteca de José Mindlin, hoje na USP, pois ele a doou para a universidade onde ele fez seu Curso de Direito, no memorável Largo São Francisco, em São Paulo: “não faço nada sem alegria”. A frase é inspirada em Montaigne. Há alguns dias deixei a Vice-reitoria de Extensão, Cultura e Educação Continuada da Universidade Estácio de Sá. Estou passando os projetos em andamento à minha sucessora, Cipriana Nicolitt Cordeiro, pessoa agradável, culta, de bom convívio universitário. Já tivemos os primeiros encontros e espero que sejam muitos, pois alguns projetos são a menina dos olhos de nossa Casa. E Cipriana mostrou-se entusiasmada em prossegui-los, alguns dos quais ainda em gestação, como é natural. Sai um Doutor em Letras, entra uma Doutora em Direito. São muito saudáveis essas substituições. Sou contra prorrogações infindáveis nos cargos. SOMOS professores, ESTAMOS nos cargos. Estou na Estácio há dez anos, onde pretendo continuar por muitos mais. Já fui Diretor do Instituto da Palavra, Diretor do Curso de Comunicação Social (com Hugo Santos e José Laranjo Duarte, meus colegas e amigos), Vice-reitor de Pós-graduação, Vice-reitor de Cultura, Coordenador Geral do Curso de Letras, Coordenador local do curso de Letras no Recreio (nota 4 na avaliação do Mec numa escala de 5, o que para uma universidade privada é muito boa nota), Coordenador das aulas teletransmitidas de Língua Portuguesa on-line, disciplina cuja implantação em todos os cursos da Estácio liderei ainda no tempo em que Dr. João Uchôa era quem determinava nossos rumos; Coordenador do Projeto Rio+Hospitaleiro (2010), premiado pelo ministério do Turismo como exemplos de boas práticas; enfim são todas coisas a considerar. Vejo um grande futuro atrás de mim, a que chamamos passado, mas que um dia foram futuro, pois foram projetos. ENFIM, SOU EX DE TUDO ISSO E MUITO MAIS. E vejo para breve um outro bom passado, quando as coisas futuras, já em andamento, acontecerem. Como São Paulo, procurei combater o bom combate e guardar a fé: a fé no poder da educação, nas relações de sentido, não nas relações de poder. Como sou de Letras, proclamo com conhecimento de causa: uma palavra dita ou escrita na hora certa e precisa, do modo adequado, por quem souber manejá-la, pode mudar tudo ou consolidar o bom! Meu lema nos cargos que ocupei é o binômio CONVERSA CLARA + TRATO JUSTO. Combinou, aceitou, faça! Sou orgulhoso do principal patrimônio acumulado nesses anos, na universidade e no Rio: a amizade. Um amigo é um tesouro e onde está nosso tesouro, ali está nosso coração. Doravante vou ler e escrever mais, vou ampliar meus trabalhos com a Bandews e com o Dicionário Caldas Aulete (limitados a tão pouco tempo por semana) e prosseguir com um projeto de pesquisa que já dura mais de vinte anos, cujos resultados são periodicamente publicados, revisados e atualizados nos livros de Etimologia. Foi esse projeto que me levou à Academia Brasileira de Filologia. Quem sabe doravante possa ter mais tempo para o agradável convívio com meus pares. Naturalmente, espero também que enfim me sobre mais tempo para escrever novos livros. Todos ganharemos com isso, inclusive a Estácio! A universidade pública faz um ato de burrice medonha ao deixar sem nenhum estímulo para continuar ali o professor que selecionou por concurso público, conheceu tão bem, no qual apostou e ajudou até que ele ficasse Doutor. Fazer o quê? As universidades privadas estão sabendo aproveitar pessoas aposentadas, que continuam no esplendor de sua produção intelectual, mesclá-las a jovens promissores e unir experiência, própria dos velhos, e inovação, própria da juventude. A mistura é alvissareira! E vamos sempre contrariar a frase famosa de Roberto Campos (também ele, como eu e tantos outros, ex-seminarista): a burrice no Brasil tem um passado glorioso e um futuro promissor! O que precisa ter um futuro promissor é a inteligência, pois já tem um passado do qual pode muito se orgulhar! Erramos? Muito! Mas só não tropeça quem não caminha! Pra frente, moçada! O sonho pode estar ali na esquina. E, se não estiver, a gente procura outra padaria! Enfim, mutatis mutandis, não é outro o caminho! Alguns o fazem chutatis chutandi. Não, nós, professores! (xx)

sexta-feira, 10 de maio de 2013

NÃO EXISTE EX-MÃE, NEM EX-FILHO

A mãe nos dá, junto com o leite, a língua na qual nos expressamos. Por isso dizemos “língua materna” e não “paterna”. Falar é um dos mais agradáveis passatempos. Pegamos esse gosto ainda na infância. Já crescidas, crianças adoram brincar com a fala. “Faz de conta” e “adivinha” são dois começos clássicos das falas infantis. “Adivinha o que eu tenho na mão, adivinha isso, adivinha aquilo.” O jogo de esconde-esconde requer adivinhar, descobrir onde está o outro. Esse linguajar algo inocente depois se especializa. Antigamente os malandros falavam ao lado dos policiais, até combinando ações criminosas, e não eram entendidos. Em 1940, um delegado de polícia publicou um livro alertando os “cidadãos honestos” para os significados ocultos da fala dos “meliantes”, “inimigos da ordem e da justiça”. Dava o seguinte exemplo. Na Central do Brasil, um meliante diz a outro: “Você lanceia o estácio e passa o vento para mim, que eu lhe espero no rustidor”, isto é, “ você bate a carteira do otário e passa o dinheiro para mim, que eu te espero no esconderijo.” Adivinhar veio do Latim addivinare. Era uma qualidade reservada aos deuses, daí seu caráter sagrado, como no caso do Oráculo de Delfos: previu ao pai (Laio) que seu filho (Édipo) o mataria para casar-se com a mãe (Jocasta). Fugindo a seu destino, Édipo encontra a Esfinge, animal estranho, com corpo de leão, patas de boi, asas de águia e rosto humano. O monstro devora a todos que não sabem decifrar a seguinte adivinhação: “Qual o animal que tem quatro patas de manhã, duas ao meio-dia e três à noite?”. Ele responde que é o homem: "Nos primeiros meses de vida (de manhã), engatinha; uma vez crescido, anda sobre os dois pés ( meio-dia) e na velhice (entardecer) recorre a uma bengala.” A esfinge se suicida num abismo. Édipo, sem saber, cumpre seu destino: mata o pai e se casa com a mãe, com quem tem quatro filhos (dois gêmeos). Ao descobrirem a verdade, Jocasta se suicida e Édipo fura os próprios olhos. A Humanidade sempre teve especial predileção por adivinhas, profecias, enigmas, charadas. As ciganas qurem ver a sorte, entender os significados ocultos etc. Entre os antigos germânicos, nos tempos medievais, a pessoa acusada de homicídio, era morta também, mas se fizesse uma adivinha que o juiz não soubesse responder, era absolvida. Levada a juízo por ter assassinado uma criança, uma jovem diz: “Sobre Ilo vou,/ sobre Ilo estou,/ sobre Ilo, a bela gentil./ Adivinhem, meus senhores, o que isso quer dizer.” Os juízes não souberam a resposta e ela foi absolvida. Ilo era o nome de seu cão, de cujo couro ela fizera um par de sapatos. PS. Hoje é dia das mães. Minha mãe morreu há alguns anos. Ainda hoje sinto saudades dela, de sua alegria e de sua coragem. Uma intuitiva e assanhada filha de italianos, e um racional e contido filho de gaúchos que nada temiam, tiveram 14 filhos! Sou o primeiro de sete meninos! Fiquem tranquilos! Estamos na Lua Nova. Se fosse na Lua Cheia, visitaria sete pátios de igreja e sete encruzilhadas antes de dar uma afiada nos dentes...(xx)

sábado, 4 de maio de 2013

AS ÚLTIMAS PALAVRAS DO PAI

Ele deveria ter uns vinte e poucos anos. Seu pai, setenta anos mais velho do que ele, ia morrer. O pai ia surpreendê-lo, não apenas por morrer em casa e de madrugada, fazendo com que o filho acordasse com os passarinhos, coisas que ele odiava: a aurora e os passarinhos. “Se ele morrer logo, o enterro pode ser hoje e a gente acaba com essa agonia”, disse a mãe, que já não aguentava mais cuidar do velho. As mulheres amam e cuidam dos homens que amam, mas isso também cansa, tudo cansa. Menos o amor, que este, sim, é imortal, e aqueles que partiram permanecem na memória daqueles que os amaram. O pai queria cochichar algo ao ouvido dele. Com o último suspiro, a última lição. “Meu filho”, começou o velho, entre sussurros e gemidos, “não faça má ideia de mim e doravante veja o mundo que você não vê.” “Sabe, a Maria Sofia, aquela gordona insone que disfarça toucinhos e banhas em largos vestidos de listras, que reza e comunga todos os domingos e se confessa uma vez por semana?” “Sei, pai”. Pois é!”. “Sabe a Maria Irene, aquela magrona, falsa magrona, porque tem bunda grande e perna grossa, casada com o Gervásio, mulher de bunda grande e perna grossa só fica solteira se quiser, as irmãs dela, todas de pernas finas, nenhuma se casou, aquela que de vez em quando convida a tua mãe pra quermesse...”. “Sei, pai.” “Pois é”. “Sabe a Maria Piíssima do Coração Sagrado de Jesus, de mãe amantíssima, de passado negro, que pôs esse nome comprido e esquisito na filha porque na hora do parto estava contemplando com fervor uma folhinha do calendário católico das Edições Paulinas? Aquela que fugiu com o João Preto, que dois dias depois a trouxe de volta, dizendo que o descasamento não era por incompatibilidade de gênios, mas por incompatibilidade de cheiros, tudo mentira, ele é que não era muito chegado à fruta, compreende?-, mas você sabe, então, de quem estou falando?”. “Sei, pai”. “Pois é”. E o pai seguiu recitando o nome de muitas, com as respectivas e estranhas identificações. Por fim, perguntou? “Deu dezenove essa lista que não é de Schindler, meu filho, filho querido?” “Dezessete, pai”, disse o filho, que contara uma a uma. “Então, faltam duas, mas essas esqueci. Pois é!” “Pois é o quê, pai?” “Não, não, ninguém soube. Nem por elas nem por mim. Não se aborreça se amanhã ou depois aparecer algum irmão extraviado. O que eu mais fiz na vida foi trabalhar, mas houve esses momentos com elas, que foram muito bons. Pois é!” O pai apertou a mão do filho e expirou, enfim. A mãe quis saber qual ela o segredo. “Nada, mãe, ele só disse que amou apenas uma mulher na vida, a senhora, mas ele ficou tímido na hora da morte.” “Coitado do teu pai”, explodiu a mãe em soluços e remorsos, “seu eu soubesse, não teria feito o que fiz quando ele viajava.” “E ele viajava muito?” “Quando você era pequeno, toda semana”. E a mãe chorou ainda mais alto, abraçada ao filho: “Eu ficava muito sozinha”. Dali a pouco, muitas outras chorariam disfarçadas ao redor do caixão do velho: “ele era um homem tão bom!” (xx)