NOME DE POBRE NO BRASIL

quinta-feira, 28 de março de 2013

PÁSCOA: DEU BARRABÁS NO PLEBISCITO

Em meu romance Goethe e Barrabás, lemos no capítulo A luz que te falta: “Salomé, com os sentimentos desarrumados por amar um homem que lança abismos e pontes entre ele e ela, mistura vigília, sono e sonho, aumentando a confusão que toma conta de suas almas, depois de vinhos rascantes e de amores insensatos”. Estava num desses eventos em que os leitores querem que o escritor fale se algumas personagens se baseiam em pessoas conhecidas, quando uma leitora muito sagaz, de 83 anos, me perguntou, respeitosa: “O senhor deu-lhe o nome de Salomé por que ela perdeu a cabeça por Barrabás num amor insensato, depois de ter feito João Batista perder a dele? Aliás, todos os amores têm um quê de insensato, mas como o senhor tomou dois personagens bíblicos, deslocando-os para atuarem unidos, pois Salomé é aquela que dançou para o rei Herodes, e Barrabás aparece na Semana Santa, eu lhe pergunto: as más escolhas de que fala o senhor são construídas por nós deliberadamente ou são obra do destino?”. O debate acontecia bem próximo a outra Páscoa e o assunto era muito pertinente. Respondi que acredito nas transcendências de nossas vidas, que somos bem diferentes de um pé de couve ou repolho, pois nascemos para olhar o que está no alto e não para chafurdar em nossa pobre condição humana. Que isso pode ser chamado de destino, talvez! Temperei com o célebre paradoxo de Blaise Pascal, escritor francês do século XVII, que disse: “o homem não é anjo, nem besta, mas quem quer ser anjo, acaba sendo besta.” A dulcíssima velhinha prosseguiu: “jamais esquecerei de outra passagem” – estava com o livro na mão e leu: “A moça descobre também que se na Judéia criassem frangos, em vez de cordeiros, Jesus teria sido o frango de Deus que tira os pecados do mundo, sem contar que para frangos e famintos o destino será sempre um só: a morte para todos. Barrabás, porém, diz à amada que a vida dele é bem diferente da de um frango. Diz também que foi Barrabás quem apareceu a Goethe, no final da vida, oferecendo-lhe a luz que faltava, mas já era tarde”. No romance, faço referência a dois personagens com o nome de Barrabás e a duas Páscoas. Na Páscoa do Antigo Testamento, os hebreus matam cordeiros e esfregam o sangue na porta das casas, para que o Anjo da Morte não mate os primogênitos. Na Páscoa do Novo Testamento, Jesus é chamado Cordeiro de Deus. Pois bem! Semana passada, depois de proferir palestra a convite do presidente do Tribunal de Justiça, em São Paulo, José Roberto Nalini, visitei outro querido amigo ali: o poeta Paulo Bonfim. E, em nossa agradável conversa, ele lembrou um livro Les deux mères (As duas mães), sobre um suposto encontro da mãe de Jesus com a mãe de Judas. Ainda não encontrei esse livro que já antevejo admirável pelo tema. Quem sabe, na próxima Páscoa possa falar dele a vocês. Tenho aprendido muito a cada Páscoa, principalmente com pessoas cuja amizade para mim é um privilégio! (xx) º Escritor e professor, autor de 34 livros, entre os quais A Placenta e o Caixão (reunião de crônicas aqui publicadas).

2 comentários:

  1. Anna Maria de Assis Ribeiro28 de março de 2013 às 08:42

    Como sempre seu texto inteligente e instigante me obriga a pensar. Quanto mais vivo mais me parece que o acaso foi sempre responsável por minhas escolhas. Ou pelo menos, foi este que me faz defrontar com as escolhas que tive que necessariamente fazer. E, dependendo das circusntância em que me encontrava no momento de fazê-las (mais uma vez o acaso) foram estas certas, erradas ou impróprias. Muitas vezes minha vida tomou um rumo completamente diverso do previsto apenas porque, sem qualquer motivo aparente, optei por seguir pela calçada da direita ao invés de pela esquerda para chegar a um mesmo destino. No trajeto escolhido encontrei pessoas, incidentes, visões, sensações e que mais sei eu, que provocaram as mais diversas e significativas modificações valendo para toda a vida. Até a de muitas vezes não chegar ao destin previsto. Também aos 83 anos acho que o acaso, e não este Deus esquisito com olhos de mistério chamado Destino, é o responsável pela orientação (ou desorientação?!) da tragetória de minha vida.

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  2. Anna, querida, que bom te ver por aqui! Feliz Páscoa e uma beijoca do Deonísio.

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