NOME DE POBRE NO BRASIL

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

UM CAVALO PARA DEPUTADO FEDERAL

Na semana que ora passa, o deputado federal Natan Donadon falou aos colegas de plenário, como de costume, mas seu discurso foi de queixas: disse que horas antes estava tomando banho, todo ensaboado, quando faltou água. Disse também que foi socorrido por colegas, não da Câmara Federal, mas do Presídio da Papuda, em Brasília, onde cumpre pena, depois de julgado e condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que não cassou seu mandato.
Isso mesmo! O STF se fez de bobo e nos fez de bobos. Alguém já nomeou um cabrito para cuidar de um gramado? Uma raposa para zelar por um galinheiro? Em poucas palavras, a Câmara se encarregou de prosseguir com outras desmoralizações: desmoralizou o STF e a sociedade brasileira, absolvendo o deputado presidiário. Agora ele cumpre pena no presídio, mas exerce o mandato de deputado federal. Bem, mas sempre restam um fio de esperança e um resto de vergonha no recôndito de alguns seres. O deputado federal Henrique Eduardo Alves, presidente da Câmara, achou que assim era demais e, contrariando os colegas, afastou o deputado presidiário e chamou o suplente para substituir aquele de quem o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, disse: “A Papuda está homenageada. Vai causar inveja aos demais reeducandos”. Se a Câmara Federal não cumpre seu Regimento, a Papuda cumpre o dela. Um funcionário daquela penitenciária já disse que o deputado presidiário será punido, pois confessou que a água lhe foi entregue numa teresa, corda de panos amarrados uns nos outros, feita de lençóis e cobertores. O Regimento da Papuda proíbe tais presentes. Bem que faz! Começam por garrafas d´água e depois mandam o quê? Esboço de projetos de lei? Os outros presos também se tornarão legisladores, farão leis que todos deveremos cumprir? Sim, se já garantiram o mandato de um presidiário, por que não avançar um pouco mais?
Terminado o discurso, o deputado federal presidiário saiu dali algemado e voltou para o xilindró, onde está vendo o Sol nascer quadrado todos os dias. O episódio nos traz à lembrança o cavalo Incitatus, que em Latim quer dizer arrojado, impetuoso, incontrolável. Roma importava da Hispania (atual Espanha) cerca de 10.000 cavalos por ano. Numa dessas levas veio um cavalo de corrida muito garboso, a quem o imperador Calígula denominou Incitatus. Caligula em Latim quer dizer botinha, é diminutivo de caliga (bota). Ele era ainda menino e se vestia como um soldado romano quando acompanhava as tropas.
O historiador Suetônio nos conta que com todos os poderes que detinha, o imperador fez de Incitatus senador, deu-lhe dezoito assessores (criados pessoais), um colar de pedras preciosas, forrou a estrebaria onde ele dormia com mantas de púrpura, cor privativa dos trajes imperiais, e mandou também construir uma estátua de mármore no tamanho real do cavalo. Calígula morreu assassinado pelo praefectus (prefeito). Quando a Lei falha, o que podemos esperar? Inocente no contexto, só o cavalo! . º Da Academia Brasileira de Filologia, escritor e professor, doutor em Letras pela USP (xx).

Nenhum comentário:

Postar um comentário