NOME DE POBRE NO BRASIL

domingo, 2 de dezembro de 2012

O DOUTOR CORONEL PREFEITO E OS IMPOSTOS

Anos 30 do s←culo passado, em alguma cidade do interior do Brasil. O coronel era autorit£rio, mas n ̄o era burro. O chefe dos Correios pediu-lhe um particular: "Chegou um telegrama urgente. O governo federal pede para abrir um procedimento administrativo com o fim de apurar por que raz ̄o o coletor de impostos n ̄o coleta nada." "Coleta, sim, eu mesmo pago todos os impostos devidos." "Mas n ̄o envia ao governo o que arrecada." O coronel espantou-se, mas logo decidiu: "Vamos l£ no Cart￳rio que eu vou mandar lavrar a certid ̄o de ￳bito deste incompetente." A Coletoria ficava num pr←dio cinza. Bateu forte com a aldrava, o argol ̄o fez um barulho danado, os vizinhos estranharam, veio ¢ porta ao lado at← uma ex-donzela que ontem mesmo tinha dado de gra￧a a virgindade a um capataz. Um dia, dali a muitas d←cadas, uma catarinense ia leiloar o que todas at← ent ̄o davam de gra￧a. O coronel mandou, delicado, mas firme, que a mo￧a se retirasse: "N ̄o ← nada com a menina, volte pra dentro e continue o que estava fazendo". Ela obedeceu e voltou a mijar, queixando-se da ard↑ncia e perguntando para uma tia solteirona se era normal ir tantas vezes ao penico. "Se avexe, n ̄o, minha filha, n ̄o ← pelo que voc↑ fez ontem, ← porque bebeu muita £gua, ser£ sempre assim." O coletor veio atender a porta e em instantes estavam todos no Cart￳rio, onde o coronel ordenou ao chefe, indicado para a fun￧ ̄o tamb←m por ele: "Lavre a certid ̄o de ￳bito desse aqui", disse, apontando para o indigitado coletor, do contr£rio todos voc↑s estar ̄o enrascados e eu tamb←m." O coletor empalideceu. O coronel estava pertinho dele e disse, severo: "Fique tranquilo, ← pro seu bem". O homem come￧ou a chorar. E o coronel: "N ̄o, n ̄o vou te matar, voc↑ n ̄o vale a bala que eu mande te botar no quengo nem a faca que talvez te sangre. Coletou s￳ pra ti, pro governo, n ̄o?". "Mas foi assim que eu entendi", disse o coletor, "o senhor n ̄o me esclareceu". "Animal burro", disse o coronel, "era para coletar para o governo." Lavrado o ￳bito, o coronel disse ao chefe dos Correios: "Junte a certid ̄o e informe a quem mandou o telegrama que o coletor era ladr ̄o, sim, mas morreu sem deixar bem nenhum, nem herdeiro, de modo que o malfeito dele n ̄o pode ser cobrado. Com a certid ̄o de ￳bito, eles v ̄o arquivar o processo". Tempos depois, morreu o chefe do Cart￳rio. Arrependido, o ex-coletor, j£ morto oficialmente, pediu o emprego. Foi nomeado, o coronel era compreensivo. Mais um tempo se passou e o coronel morreu. O chefe do Cart￳rio, j£ velho, divertia-se mostrando a p£gina do livro onde estava assentado o seu ￳bito, muitas e muitas p£ginas antes do do coronel. Quando o ex-lar£pio morreu, n ̄o foi lavrada outra certid ̄o de ￳bito. Ele n ̄o podia morrer duas vezes. E se algu←m mexesse naquilo, alguns antigos ￳rf ̄os iam perder a pens ̄o. (xx) PS. Dedico esta cr￴nica a Rob←rio Nunes dos Anjos, doutor em Direito pela USP, desembargador aposentado, a quem agrade￧o o jantar, o vinho e principalmente a prosa, degustados em Boa Vista, Roraima, em novembro de 2012. " Da Academia Brasileira de Filologia (cadeira 33), Doutor em Letras pela USP, escritor e Vice-reitor da Universidade Est£cio de S£, autor de Lotte &Zweig, entre outros 33 livros.

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