Bater, verbo que tem grande número de sentidos, a ponto ocupar uma coluna inteira no dicionário Houaiss impresso, por exemplo, veio do latim vulgar battere, significando surrar. Sujar, de outro lado, teve origem em sujo, do latim succidus, úmido, molhado, gorduroso.
por Deonísio da Silva*
Bater: do latim vulgar battere, significando surrar, mas aplicando-se também a bater a massa do pão; bater a porta na cara de alguém, para impedir a entrada; bater à porta de alguém para solicitar alguma coisa; bater a falta, bater o pênalti; bater no rochedo, como as ondas; bater em Brasília, isto é, ir lá para pleitear algo; bater recorde; bater em retirada; bater na casa dos 100 anos, isto é, chegar ao centenário, como o fez o arquiteto Oscar Niemeyer (103) há três anos; bater asas, isto é, partir; bater cabeça, variante para quebrá-la de tanto preocupar-se; bater o santo, isto é, entender-se com alguém cujo gênio é semelhante ao nosso; e, em não sendo, dizer "meu santo não bate com o dele"; bater a cidade toda, isto é, procurar por todos os lugares, centro e bairros. A expressão "bateu, levou" está presente em Mil Dias de Solidão: Collor Bateu e Levou, de Cláudio Humberto Rosa, porta-voz da presidência da República no governo de Fernando Collor de Mello (61). O livro chegava aos leitores no mesmo ano em que a revista CARAS estreava no Brasil, novembro de 1993.
Livre-comércio: de livre, do latim liber, entrecasca de árvore sobre a qual se escrevia antes da descoberta do papiro; Liber era também o nome de uma divindade itálica com as funções de Baco; e de comércio, do latim commercium, de merx, mercadoria. Quando a revista CARAS estreou no Brasil, o presidente era Itamar Cautiero Franco (80), vice de Fernando Collor, a quem substituiu porque o titular tinha sido afastado em sessão conjunta do Congresso e do Supremo Tribunal Federal, em 29 de dezembro do ano anterior. Os dois são atualmente senadores. Nos Estados Unidos, o presidente Bill Clinton (64) festejava a aprovação do Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (a sigla em inglês é Nafta) na Câmara dos Representantes, por uma vantagem superior à esperada: 234 a 200 votos. O presidente teve que contrariar os sindicalistas do Partido Democrata, pelo qual se elegera, que combateram sua iniciativa, temendo desemprego. Mais tarde, além dos Estados Unidos e do México, o Chile passou a integrar o tratado. Eleito em 3 de novembro de 1992, Clinton fez um dos melhores governos dos Estados Unidos, mas quase sofreu impeachment por ter mentido ao povo, negando que tivera relações sexuais com a estagiária Monica Levinski (37). O Senado concedeu-lhe perdão, e o povo também.
Parador: do espanhol parador, hotel oficial mantido por organismos públicos; de parado, de parar, do latim parare, preparar, tendo também o sentido de interromper. No caso, interrupção da viagem para descanso, com o fim de visitar a cidade ou a vila onde está sediado o parador. Os paradores espanhóis são hotéis especiais, cujos aposentos ocupam monumentos históricos restaurados em toda a Espanha. Faturam 245 milhões de euros por ano e empregam mais de 5000 pessoas. Foram criados em 1928. Por preços abaixo dos praticados pela rede hoteleira, o turista fica em castelos bem decorados, em que predominam o bom gosto das instalações, serviçais preparados e bem treinados, além de culinárias especiais. Em alguns deles, é possível hospedar-se e comer como um cavaleiro medieval, por exemplo. E nos quartos, despir a roupa, não a armadura, naturalmente.
Repto: de reptar, do latim reputare, refazer as contas, recalcular, ligado a putare, limpar, cortar, que é o étimo também de podar; as plantas, no sentido denotativo; as pessoas, no sentido conotativo, impondo limites semelhantes àqueles fixados para árvores, arbustos, gramas. Lançar um repto a alguém é desafiá-lo.
Sujar: de sujo, do latim succidus, úmido, molhado, gorduroso. O homem suja tudo, pois a sujeira decorre do próprio ato de existir e para isso sempre tomou providências ao longo da história, erguendo cidades à beira de rios, não apenas para aproveitar água limpa em bebidas e comidas, mas também em higiene, retirando o suor que molhava e sujava a roupa, lavando talheres e utensílios, limpando a casa. Mais recentemente, vem cuidando de limpar também os rios, as ruas, os lagos e o próprio mar, depositários de tantas impurezas. Rafael Greca de Macedo (54) assumiu a prefeitura de Curitiba quando CARAS chegava pela primeira vez às bancas de todo o Brasil e a ecologia consolidava-se como tema freqüente na mídia por causa da ECO-92. Ele disse a um grupo de moradoras que reclamavam de um rio, sujo porque havia na localidade centenas de ligações clandestinas que levavam a sujeira diretamente para o pobre rio: "O Barigui está sujo porque vocês o sujaram; rio não faz cocô".
* Deonísio da Silva (62), escritor, é doutor em Letras pela Universidade de São Paulo (USP), professor, pró-reitor de Cultura e Extensão da Universidade Estácio de Sá, do Rio de Janeiro, e autor de A Placenta e o Caixão, Avante, Soldados: Para Trás e Contos Reunidos (Editora LeYa). Seus livros já foram premiados pelo MEC, Biblioteca Nacional e Casa de las Américas. E-mail: deonisio@terra.com.br
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