Etimologia
Deonísio da Silva, na revista CARAS
Confuso, do latim confusus, formado a partir de cum, com, e fundire, fundir, é o mínimo que se pode dizer do autor do massacre de 12 adolescentes em escola carioca. Para especialistas, o rapaz era esquizofrênico, adjetivo formado de esquizofrenia, do francês schizophrénie.
por Deonísio da Silva*
Aleúte: de origem obscura, provavelmente do inglês aleut, adjetivo gentílico para designar o habitante ou nativo das ilhas Aleutas, situadas no noroeste da América do Norte, e de certas partes do Estado do Alasca. Esses povos falam duas línguas aleútes, aparentadas com o esquimó. A palavra pode ter chegado ali depois de levada para o russo de algum dialeto da Ásia. Do russo chegou ao inglês, disseminando-se do latim do império americano para diversas outras línguas, inclusive para o português. Há poucas palavras do aleúte na língua portuguesa. Uma delas é parca.
Confuso: do latim confusus, confuso, misturado, palavra formada a partir de cum, com, e fundire, fundir. A confusão mental extrema pode levar a atos criminosos como o que praticou Wellington Menezes de Oliveira (1987-2011), autor do massacre que resultou na execução à queima-roupa de 12 adolescentes na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, no Rio de Janeiro, no último dia 7. Filho biológico de mulher esquizofrênica, ele sofria de esquizofrenia severa, doença mental que muito preocupava sua mãe adotiva, que lhe providenciou tratamento até deixá-lo órfão. Depois ninguém mais cuidou dele, nem ele pôde cuidar de si mesmo, perdendo-se num labirinto de confusões mentais que o levaram a misturar elementos religiosos para justificar o injustificável: a execução de inocentes para vingança dos maus-tratos recebidos na mesma escola, que ele frequentara quando tinha a idade das vítimas.
Duplicidade: do latim duplicitate, declinação de duplicitas, designando aquilo que é duplo, que oferece duas faces ou dupla personalidade, ligada à esquizofrenia, doença de personalidade múltipla. A banda The Who lançou em 1973 seu sexto álbum, Quadrophenia, modificando o termo esquizofrenia, designando uma ópera musical com este nome. Nela, o protagonista sofre de personalidade quádrupla, cada uma delas associada a um integrante da banda. Há quatro músicas-tema: Helpless Dancer, Doctor Jimmy, Bell Boy e Love Reign O'er Me, que voltam na penúltima faixa do disco, em peça intitulada The Rock.
Esquizofrênico: de esquizofrenia, do francês schizophrénie e do inglês schizophrenia, palavras radicadas nos étimos do verbo grego skhízo, separar, e do substantivo phrenés, mente. Designa manifestações psicóticas e distúrbios mentais como delírios e alucinações. O termo foi cunhado pelo psiquiatra suíço Eugen Bleurer (1857-1939), que deu o primeiro emprego de psiquiatra residente ao também suíço Carl Jung (1875-1961), fundador da psicologia analítica. Até então a doença era tida como demência precoce.
Fatalidade: do latim fatalitate, declinação de fatalitas, necessidade do fatum, destino. As fates romanas, também designadas parcas, adaptadas das Moiras gregas, eram três: Nona, Décima e Morta, equivalentes às gregas Cloto, Láquesis e Átropos. Elas, hoje, na versão helênica, designam remédios prescritos pela homeopatia. Nona tecia o fio da vida; Décima determinava sua extensão e caminho a percorrer; e Morta cortava esse fio. O termo fatalidade, designando desgraça, tragédia ou simplesmente o fim abrupto de alguma coisa, nasceu de certas metáforas ligadas a essas deusas, cujas decisões eram irrecorríveis e nem mesmo Zeus, na Grécia, ou Júpiter, em Roma, podiam revê-las. Os antigos romanos adotavam o calendário solar para os anos e o lunar para os meses. Assim, a gravidez das mulheres não era de nove meses, mas de nove luas. Nona tecia o fio da vida no útero materno até a nona lua; Décima cortava o cordão umbilical, determinando o começo da vida terrena da pessoa, na décima lua; e Morta cuidava da outra ponta da vida, que poderia acabar a qualquer momento. Nasceu aí a significação de fatalidade.
Parca: do aleúte parka, casaco de pele, com capuz, cujo comprimento alcança o meio da coxa ou o joelho, usado nas regiões polares e em outras muito frias. Passou ao inglês parka, de onde migrou para o português para designar casaco semelhante, em geral de tecido impermeável, às vezes forrado de lã, e usado por militares e esportistas. Nos anos 1960, a juventude inglesa popularizou esse tipo de vestuário, em cor verde-militar, com o escudo da Força Aérea Inglesa. No filme Quadrophenia, dirigido pela banda de roque The Who, os rapazes usam esse tipo de vestuário para se protegerem do frio e também para recordarem a coragem, o valor e o heroísmo de seus pais, pilotos combatentes na II Guerra Mundial. Entre os militares brasileiros, esse tipo de abrigo é conhecido por jaqueta.
NOME DE POBRE NO BRASIL
sexta-feira, 22 de abril de 2011
NOMES DE CARRO,
Deonísio da Silva, no Jornal do Brasil, 20 de abril de 2011
Provavelmente os celtas não achariam confortável o automóvel com que a General Motors e a Chevrolet os homenageiam. Os celtas eram fortes e altos e, se lhes fosse dado escolher o meio de transporte, hoje, entre um Celta e um Bora, escolheriam o segundo.
Os celtas, de cepa indo-germânica, migraram do centro-sul da Europa, em ondas sucessivas, para a Bretanha, a Espanha e a Itália, povoando ainda a região dos Bálcãs e da Ásia Menor.
O Bora, mais amplo, com mais conforto, levaria o seu dono celta para onde o viajante quisesse. A Volkswagen escolheu esse nome para um de seus carros porque bora designa um vento que sopra no sul do Mar Adriático. Talvez os engenheiros quisessem vincular o carro ao famoso vento porque, a bordo dele, veloz e livre como o vento, o ocupante pode ir aonde bem quiser.
Os irreverentes cantores da banda Mamonas Assassinas, tragicamente falecidos em desastre aéreo, em 1996, proclamaram em conhecida canção: “Minha Brasília amarela/ Tá de portas abertas/ Pra mode a gente se amar/ Pelados em Santos”. O carro com que a Volkswagen tinha homenageado a capital do Brasil já não era mais fabricado.
Os irmãos Karl Rath e Gustav Otto começaram a fabricar motores de avião na Primeira Guerra Mundial. E, ao lançarem o primeiro automóvel, em 1928, mantiveram o símbolo, duas hélices, uma preta, outra azul, em fundo branco, no veículo terrestre conhecido como BMW, iniciais das palavras alemãs Bayerische Motoren Werk (Fábrica de Motores da Bavária).
Abrasileirar nomes é nosso velho costume. Quando Getulio Vargas nacionalizou a Alfa Romeo, os caminhões passaram a ostentar em letras garrafais as iniciais FNM, de Fábrica Nacional de Motores. E o caminhão passou a ser conhecido como fenemê.
Aconteceu algo semelhante com o DKW. As letras maiúsculas são as iniciais de Dampf-Kraft-Wagen, carro de força a vapor: A empresa alemã, fundada por um engenheiro dinamarquês, começou fabricando pequenos motores a vapor. Passou depois aos motores a gasolina com ciclo de dois tempos, mantendo a denominação DKW. O vapor dos primeiros motores simplesmente evaporou-se no tempo. E hoje quem tem um automóvel DKW guarda-o como joia rara.
A General Motors ainda hoje mantém a gravata-borboleta em seus veículos. O vapor dos primeiros motores simplesmente evaporou-se no tempo. E hoje quem tem um automóvel DKW guarda-o como joia rara. O motorista se esfalfava de macacão ao volante do caminhão, mas era mantida a imaginação do designer, que o imaginou usando terno e gravata-borboleta.
A Citroën, empresa francesa fundada por André Citroën, resolveu homenagear o filho do empreendedor, identificando seus automóveis com os deux chevron, a patente de cabo que o moço tinha no braço quando morreu em combate na Primeira Guerra Mundial. São duas letras V invertidas. É uma versão lendária esta, mas há outra mais prosaica: seria o símbolo da engrenagem helicoidal, dupla, criada por Monsieur Citroën.
E mecânico sem macacão, existe? O alemão que ouve pela primeira vez a palavra macacão demora a entender que se trata de uma Latzhose, própria para os trabalhos de jardinagem, e por isso chamada também jardineira. Como a cor azul fosse predominante nesse tipo de uniforme, os alemães usaram a variante Blaumann, homem (Mann) azul (blau). Os alemães marcam o substantivo com a inicial maiúscula.
Um alemão que conhecia pouco a língua portuguesa e estava de carona com um brasileiro, ficou aparvalhado quando, de pneu furado, com o carro em que estava já no acostamento, ouviu do motorista que ele iria tirar o macaco do porta-malas para substituir aquela roda pelo estepe. Confessou depois que ficou imaginando como podiam ter a companhia de um macaco e como o animal viajara silencioso, preso ali atrás, e que ainda seria utilizado na tarefa. Mas era apenas um Wagenheber, erguedor mecânico de carro.
Macaco é mais simples, mesmo. E o brasileiro adora uma síntese. (xx)
Provavelmente os celtas não achariam confortável o automóvel com que a General Motors e a Chevrolet os homenageiam. Os celtas eram fortes e altos e, se lhes fosse dado escolher o meio de transporte, hoje, entre um Celta e um Bora, escolheriam o segundo.
Os celtas, de cepa indo-germânica, migraram do centro-sul da Europa, em ondas sucessivas, para a Bretanha, a Espanha e a Itália, povoando ainda a região dos Bálcãs e da Ásia Menor.
O Bora, mais amplo, com mais conforto, levaria o seu dono celta para onde o viajante quisesse. A Volkswagen escolheu esse nome para um de seus carros porque bora designa um vento que sopra no sul do Mar Adriático. Talvez os engenheiros quisessem vincular o carro ao famoso vento porque, a bordo dele, veloz e livre como o vento, o ocupante pode ir aonde bem quiser.
Os irreverentes cantores da banda Mamonas Assassinas, tragicamente falecidos em desastre aéreo, em 1996, proclamaram em conhecida canção: “Minha Brasília amarela/ Tá de portas abertas/ Pra mode a gente se amar/ Pelados em Santos”. O carro com que a Volkswagen tinha homenageado a capital do Brasil já não era mais fabricado.
Os irmãos Karl Rath e Gustav Otto começaram a fabricar motores de avião na Primeira Guerra Mundial. E, ao lançarem o primeiro automóvel, em 1928, mantiveram o símbolo, duas hélices, uma preta, outra azul, em fundo branco, no veículo terrestre conhecido como BMW, iniciais das palavras alemãs Bayerische Motoren Werk (Fábrica de Motores da Bavária).
Abrasileirar nomes é nosso velho costume. Quando Getulio Vargas nacionalizou a Alfa Romeo, os caminhões passaram a ostentar em letras garrafais as iniciais FNM, de Fábrica Nacional de Motores. E o caminhão passou a ser conhecido como fenemê.
Aconteceu algo semelhante com o DKW. As letras maiúsculas são as iniciais de Dampf-Kraft-Wagen, carro de força a vapor: A empresa alemã, fundada por um engenheiro dinamarquês, começou fabricando pequenos motores a vapor. Passou depois aos motores a gasolina com ciclo de dois tempos, mantendo a denominação DKW. O vapor dos primeiros motores simplesmente evaporou-se no tempo. E hoje quem tem um automóvel DKW guarda-o como joia rara.
A General Motors ainda hoje mantém a gravata-borboleta em seus veículos. O vapor dos primeiros motores simplesmente evaporou-se no tempo. E hoje quem tem um automóvel DKW guarda-o como joia rara. O motorista se esfalfava de macacão ao volante do caminhão, mas era mantida a imaginação do designer, que o imaginou usando terno e gravata-borboleta.
A Citroën, empresa francesa fundada por André Citroën, resolveu homenagear o filho do empreendedor, identificando seus automóveis com os deux chevron, a patente de cabo que o moço tinha no braço quando morreu em combate na Primeira Guerra Mundial. São duas letras V invertidas. É uma versão lendária esta, mas há outra mais prosaica: seria o símbolo da engrenagem helicoidal, dupla, criada por Monsieur Citroën.
E mecânico sem macacão, existe? O alemão que ouve pela primeira vez a palavra macacão demora a entender que se trata de uma Latzhose, própria para os trabalhos de jardinagem, e por isso chamada também jardineira. Como a cor azul fosse predominante nesse tipo de uniforme, os alemães usaram a variante Blaumann, homem (Mann) azul (blau). Os alemães marcam o substantivo com a inicial maiúscula.
Um alemão que conhecia pouco a língua portuguesa e estava de carona com um brasileiro, ficou aparvalhado quando, de pneu furado, com o carro em que estava já no acostamento, ouviu do motorista que ele iria tirar o macaco do porta-malas para substituir aquela roda pelo estepe. Confessou depois que ficou imaginando como podiam ter a companhia de um macaco e como o animal viajara silencioso, preso ali atrás, e que ainda seria utilizado na tarefa. Mas era apenas um Wagenheber, erguedor mecânico de carro.
Macaco é mais simples, mesmo. E o brasileiro adora uma síntese. (xx)
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