Da coluna do cronista Sérgio da Costa Ramos, da Academia Catarinense de Letras, saudando a eleição do conterrâneo para a ABRAFIL: "Pelo unânime sufrágio dos 33 votantes, o catarinense de Siderópolis Deonísio da Silva foi eleito, sábado último, para a Academia Brasileira de Filologia, espécie de Butantã dos mestres da palavra, presidido pelo filólogo Antônio Martins de Araújo.
Autor de cinco livros que tratam de etimologia e morfologia, entre eles o best-seller “De Onde Vem as Palavras” – além de uma vintena de livros de uma literatura de vanguarda, em que pontifica o premiado “Avante Soldados, Para Trás!” – Deonísio da Silva é o romancista catarinense mais conhecido e traduzido no exterior. Filólogos do renome de Evanildo Bechara, Domício Proença Filho e Amós Coelho da Silva votaram no catarinense como uma “homenagem a um intelectual totalmente devotado à história da palavra e da literatura”.
NOME DE POBRE NO BRASIL
terça-feira, 30 de agosto de 2011
quarta-feira, 24 de agosto de 2011
O OCASO DAS RAPOSAS FELPUDAS
É provável que a palavra raposa tenha vindo do espanhol rabosa, por influência do enorme rabo. Virou raposa por influência de rapiega, designação do macho desse animal nas Astúrias.
José Pedro Machado, grande pesquisador da etimologia de nosso idioma, registrou a presença de raposa em textos do século 12, quando, ainda preso ao latim, mas recebendo influências de línguas e formas dialetais da Península Ibérica, o português intentava consolidar-se como língua autônoma.
Raposa foi palavra tomada pela mídia nacional, provavelmente a partir da obsessão com que o rádio e os jornais, bem antes da televisão e da internet, passaram a acompanhar os políticos, quando figuras referenciais mandavam e desmandavam na vida brasileira, o que deve ter ocorrido depois das Revoluções das décadas de 1920 e 30. Luciano Martins Costa tratou dos políticos raposões em comentário neste Observatório (“No tempo das raposas felpudas“, na segunda-feira (22/8).
Custo da corrupção
Mas a esperteza das novas raposas é outra. Não se distinguem mais no proscênio ou nos bastidores, ordenando a vida institucional e política a partir de diálogos cuja veracidade era de difícil comprovação ou simplesmente folclóricos, com o fim último de fazer prevalecer o “brasileiro cordial”, esse duro embuste sociológico que nos é empurrado há décadas, como se fôssemos de fato cordiais.
Rios vermelhos de sangue atravessam a vida brasileira, frutos de revoluções, sebaças, arruaças, revoltas, bagunças etc, ainda que, se liderados pela elite política, sejam sempre chamados revoluções. Quando o povo intenta conduzir a inconformidade por si mesmo, daí não pode se beneficiar do manto redentor de um nome tão chique como revolução. Assim, movimentos armados como a Revolução Farroupilha e a Revolução de 1930, com tal designação estratégica, ganham o brilho de outras duas grandes revoluções, a Francesa, no século 18, e a Russa, no século 19.
Todavia a guerra praticada por outros meios, isto é, propriamente políticos, recebeu numerosos contingentes de atores que de raposa só têm o rabo. E de rabo preso eles dizem estar apenas com os eleitores que os enviaram a Brasília para representá-los.
A mídia fez crer muitas vezes que tinha acuado os políticos corruptos, cúmplices ou omissos diante de falcatruas. “Estou me lixando para a opinião pública. Vocês batem, mas a gente se reelege”, disse em 2009 um dos denunciados.
Mas há uma novidade na cena política brasileira. No Executivo, a faxina ética que a presidente Dilma Rousseff empreende já repercute no exterior, com destaque para o apoio dos empresários à faxina e a lembrança de que a corrupção custa R$ 50 bilhões por ano, verba suficiente para construir 57.000 escolas.
“Lenta surpresa”
Dilma substituiu José Dirceu na Casa Civil. E Lula na Presidência da República. Os substituídos tratavam de outra maneira corruptos e corruptores, que vivem se repetindo há séculos no Brasil. Mas Dilma não os repetiu. Nem na Casa Civil, nem na Presidência.
Em A Trama, conto de Jorge Luís Borges, o mote é a célebre frase de Júlio César a Júnio Bruto, seu filho adotivo – “Até tu, Bruto, meu filho?” –, popularizada pelo teatro de Shakespeare.
Diz o narrador:
“Ao destino agradam as repetições, as variantes, as simetrias; dezenove séculos depois, no sul da província de Buenos Aires, um gaúcho é agredido por outros gaúchos e, ao cair, reconhece um afilhado seu e lhe diz com mansa reprovação e lenta surpresa (estas palavras devem ser ouvidas, não lidas): ‘Pero, che!’. Matam-no e ele não sabe que morre para que se repita uma cena”.
***
[Deonísio da Silva é escritor e professor universitário]
José Pedro Machado, grande pesquisador da etimologia de nosso idioma, registrou a presença de raposa em textos do século 12, quando, ainda preso ao latim, mas recebendo influências de línguas e formas dialetais da Península Ibérica, o português intentava consolidar-se como língua autônoma.
Raposa foi palavra tomada pela mídia nacional, provavelmente a partir da obsessão com que o rádio e os jornais, bem antes da televisão e da internet, passaram a acompanhar os políticos, quando figuras referenciais mandavam e desmandavam na vida brasileira, o que deve ter ocorrido depois das Revoluções das décadas de 1920 e 30. Luciano Martins Costa tratou dos políticos raposões em comentário neste Observatório (“No tempo das raposas felpudas“, na segunda-feira (22/8).
Custo da corrupção
Mas a esperteza das novas raposas é outra. Não se distinguem mais no proscênio ou nos bastidores, ordenando a vida institucional e política a partir de diálogos cuja veracidade era de difícil comprovação ou simplesmente folclóricos, com o fim último de fazer prevalecer o “brasileiro cordial”, esse duro embuste sociológico que nos é empurrado há décadas, como se fôssemos de fato cordiais.
Rios vermelhos de sangue atravessam a vida brasileira, frutos de revoluções, sebaças, arruaças, revoltas, bagunças etc, ainda que, se liderados pela elite política, sejam sempre chamados revoluções. Quando o povo intenta conduzir a inconformidade por si mesmo, daí não pode se beneficiar do manto redentor de um nome tão chique como revolução. Assim, movimentos armados como a Revolução Farroupilha e a Revolução de 1930, com tal designação estratégica, ganham o brilho de outras duas grandes revoluções, a Francesa, no século 18, e a Russa, no século 19.
Todavia a guerra praticada por outros meios, isto é, propriamente políticos, recebeu numerosos contingentes de atores que de raposa só têm o rabo. E de rabo preso eles dizem estar apenas com os eleitores que os enviaram a Brasília para representá-los.
A mídia fez crer muitas vezes que tinha acuado os políticos corruptos, cúmplices ou omissos diante de falcatruas. “Estou me lixando para a opinião pública. Vocês batem, mas a gente se reelege”, disse em 2009 um dos denunciados.
Mas há uma novidade na cena política brasileira. No Executivo, a faxina ética que a presidente Dilma Rousseff empreende já repercute no exterior, com destaque para o apoio dos empresários à faxina e a lembrança de que a corrupção custa R$ 50 bilhões por ano, verba suficiente para construir 57.000 escolas.
“Lenta surpresa”
Dilma substituiu José Dirceu na Casa Civil. E Lula na Presidência da República. Os substituídos tratavam de outra maneira corruptos e corruptores, que vivem se repetindo há séculos no Brasil. Mas Dilma não os repetiu. Nem na Casa Civil, nem na Presidência.
Em A Trama, conto de Jorge Luís Borges, o mote é a célebre frase de Júlio César a Júnio Bruto, seu filho adotivo – “Até tu, Bruto, meu filho?” –, popularizada pelo teatro de Shakespeare.
Diz o narrador:
“Ao destino agradam as repetições, as variantes, as simetrias; dezenove séculos depois, no sul da província de Buenos Aires, um gaúcho é agredido por outros gaúchos e, ao cair, reconhece um afilhado seu e lhe diz com mansa reprovação e lenta surpresa (estas palavras devem ser ouvidas, não lidas): ‘Pero, che!’. Matam-no e ele não sabe que morre para que se repita uma cena”.
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[Deonísio da Silva é escritor e professor universitário]
segunda-feira, 15 de agosto de 2011
TABLET: FERRAMENTA DE ENSINO
Essa nova ferramenta vai revolucionar o modo de ensinar! O tablet, cujo nome inglês é adaptação do francês tablete - mesinha, placa, tabuinha, caderno de anotações e lembranças - é a versão eletrônica da lousa.
Lousa é palavra que veio do latim lausiae, pedra rasa assentada sobre a sepultura, redução de lausiae lapides, pedra de ardósia, de tamanhos variados, com moldura de madeira, posta sobre a carteira escolar, fixada na parede ou sobre um cavalete, destinada a nela se escrever com giz.
Desde a antiga Roma, o aluno levava a lousa para a schola, intervalo para aprender, depois que o ensino deixou a aula, o palácio, e foi levado a todos, livres ou escravos. Aula passou a designar depois a hora gasta no intervalo para aprender alguma coisa.
Com o tempo, ficou apenas a lousa grande, que mudou de nome para quadro-negro, e em cuja superfície o aluno às vezes era instado a manifestar a todos os colegas e ao professor sua ignorância ou saber! No tablet, a ignorância ou a sabedoria tornaram-se privativas de cada um, que vai partilhar, com liberdade, apenas o que quiser!
Caderno, do latim quaternus, assim chamado porque originalmente era uma folha dobrada em quatro partes, para substituir o papiro e a lousa, vai receber poderosa ajuda do tablet, que será também caderno eletrônico.
E livro, do latim liber, do mesmo étimo de libertas, liberdade, que nos torna livres da ignorância, vai continuar nas bibliotecas, mas os capítulos que o aluno precisa ler ou consultar estarão destacados no tablet.
Sempre houve a difusão do conhecimento, do latim diffusione, declinação de diffusio, do mesmo étimo de fundere, espalhar, e de funda, funda, laçada de couro ou de borracha para atirar pedras. Mas era restrita à escola, à família, a parentes e vizinhos. O surgimento do jornal deu poderosa ajuda a professores, que, por meio de recortes, levaram para a sala de aula matérias mais atualizadas das que estavam nos livros. Na mídia, depois do jornal, do rádio e da televisão, a difusão ganhou dimensões de multimídia.
Agora professores e alunos podem ler mais, não apenas em quantidade, mas também em qualidade, uma vez que no tablet estarão textos editados por docentes que entendem da matéria e não vão depender, como dependiam antes, de autores que escreviam livros referenciais, mas estavam longe da sala de aula, ainda o lugar para, face a face ou à distância, aprender com o professor.
Ao investir contra os franquistas que invadiram a Universidade de Salamanca para prendê-lo, o reitor Miguel de Unamuno definiu no calor da hora o lugar em que fazia seu trabalho e quem era ele: “Este é o templo da inteligência! E eu sou o seu sumo sacerdote! Vós estais a profanar o meu recinto sagrado. Vencerão, mas não convencerão, porque convencer significa persuadir.”
Docentes, sumos sacerdotes no templo que é a sala de aula, acabam de receber um novo e revolucionário paramento: o tablet. Depois dele, o ensino nunca mais será o mesmo. Será melhor! (xx)
Lousa é palavra que veio do latim lausiae, pedra rasa assentada sobre a sepultura, redução de lausiae lapides, pedra de ardósia, de tamanhos variados, com moldura de madeira, posta sobre a carteira escolar, fixada na parede ou sobre um cavalete, destinada a nela se escrever com giz.
Desde a antiga Roma, o aluno levava a lousa para a schola, intervalo para aprender, depois que o ensino deixou a aula, o palácio, e foi levado a todos, livres ou escravos. Aula passou a designar depois a hora gasta no intervalo para aprender alguma coisa.
Com o tempo, ficou apenas a lousa grande, que mudou de nome para quadro-negro, e em cuja superfície o aluno às vezes era instado a manifestar a todos os colegas e ao professor sua ignorância ou saber! No tablet, a ignorância ou a sabedoria tornaram-se privativas de cada um, que vai partilhar, com liberdade, apenas o que quiser!
Caderno, do latim quaternus, assim chamado porque originalmente era uma folha dobrada em quatro partes, para substituir o papiro e a lousa, vai receber poderosa ajuda do tablet, que será também caderno eletrônico.
E livro, do latim liber, do mesmo étimo de libertas, liberdade, que nos torna livres da ignorância, vai continuar nas bibliotecas, mas os capítulos que o aluno precisa ler ou consultar estarão destacados no tablet.
Sempre houve a difusão do conhecimento, do latim diffusione, declinação de diffusio, do mesmo étimo de fundere, espalhar, e de funda, funda, laçada de couro ou de borracha para atirar pedras. Mas era restrita à escola, à família, a parentes e vizinhos. O surgimento do jornal deu poderosa ajuda a professores, que, por meio de recortes, levaram para a sala de aula matérias mais atualizadas das que estavam nos livros. Na mídia, depois do jornal, do rádio e da televisão, a difusão ganhou dimensões de multimídia.
Agora professores e alunos podem ler mais, não apenas em quantidade, mas também em qualidade, uma vez que no tablet estarão textos editados por docentes que entendem da matéria e não vão depender, como dependiam antes, de autores que escreviam livros referenciais, mas estavam longe da sala de aula, ainda o lugar para, face a face ou à distância, aprender com o professor.
Ao investir contra os franquistas que invadiram a Universidade de Salamanca para prendê-lo, o reitor Miguel de Unamuno definiu no calor da hora o lugar em que fazia seu trabalho e quem era ele: “Este é o templo da inteligência! E eu sou o seu sumo sacerdote! Vós estais a profanar o meu recinto sagrado. Vencerão, mas não convencerão, porque convencer significa persuadir.”
Docentes, sumos sacerdotes no templo que é a sala de aula, acabam de receber um novo e revolucionário paramento: o tablet. Depois dele, o ensino nunca mais será o mesmo. Será melhor! (xx)
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