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quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

DEONÍSIO DA SILVA: ENTREVISTA A BRUNA FÜCHTER NOS 130 ANOS DA HOEPCKE

Confira a entrevista com Deonísio da Silva, etimologista da revista CARAS 09/12/2014 Isto se chama etimologia, uma atividade fascinante em busca da origem das palavras. Ninguém melhor que ele, professor, etimologista brasileiro e autor de diversos livros premiados para falar conosco sobre o assunto: DEONÍSIO DA SILVA. Deo, como gosta de ser chamado pelos amigos, escreve há 20 anos uma coluna semanal de etimologia na revista CARAS, onde traz curiosidades sobre a origem das palavras. Conversamos com ele sobre seu trabalho e de onde vêm suas inspirações. Confira esta entrevista exclusiva abaixo (Bruna Füchter)
1- Você assina uma coluna na revista Caras sobre etimologia, ou seja, sobre a origem e o significado das palavras. Como você faz para escolher as palavras que serão abordadas? As palavras são escolhidas por vários critérios, mas damos atenção especial àquelas que estão na ordem do dia. Se os leitores repararem bem, as palavras que se destacam no dia a dia estão na revista CARAS. E de seis delas, toda semana, os assinantes e os leitores eventuais sabem a origem, de onde vieram, que escalas fizeram em outras línguas, o que significavam anteriormente e o que hoje significam. 2- O que “palavra” significa para você? Tudo! Com ela amamos, trabalhamos, lutamos, vivemos. Gente de palavra é gente séria. Os vários significados de "palavra", de que é exemplo a expressão "ser pessoa de palavra", isto é, honesta, faz coincidir o que diz com o que é e com o que faz. Mas "palavra" tem suas complexas sutilezas. Ela é meio estranha, provém de uma adaptação feita pela Igreja, que dominou o império romano do século IV ao XV: sua origem é o Hebraico "párehál", que passou ao Grego como "parabolé", virou "parabola" no Latim e "palavra" no Português. "No princípio era o Verbo". "In principio erat Verbum", na tradução do Grego ou do Aramaico, feita por São Jerônimo, para a versão Vulgata, da bíblia, diz o Evangelho de São João, o mais culto dos quatro narradores oficiais. O Alemão prefere "Wort", sempre com inicial maiúscula, mesmo no meio das frases, porque é um substantivo. E mesmo as palavras cruzadas os alemães chamam "Kreuzworträtsel" (eles nunca mexeram no trema!), em que o étimo de "Wort" está ali no meio. O Inglês prefere "word", que, aliás dá nome a um programa de informática para escrever. Mas línguas neolatinas, muito influenciadas pelo Latim eclesiástico, mantiveram o étimo vindo do Hebraico, do Grego e do Latim. "Parola", em Italiano; "parole", em Francês; "palabra", em Espanhol. Veja que, quando os Ingleses inventaram o sistema dos aristocratas consultarem também a burguesia urbana e os produtores rurais para as decisões de governo, eles trouxeram uma palavra de origem francesa, o "parliament", do Latim "parabolare", que deu "parlare" em Italiano e "parler" em Francês. Até o Alemão respeitou este étimo, aceitando "Parlament" em lugar de "Bundeshaus". 3- Qual o poder da palavra no dia a dia? Respondo com um trecho do romance "Avalovara", do escritor Osman Lins, professor da USP, que sei de cor, pois acho memorável: "A palavra sagra os reis, exorciza os possessos, efetiva os encantamentos. Capaz de muitos usos, é também a bala dos desarmados e o bicho que corrói as carcaças podres". Ou com Carlos Drummond de Andrade: "Lutar com palavras é a luta mais vã, entanto lutamos, mal rompe a manhã". Quanto a mim, me defino como "botânico e jardineiro das palavras". Botânico, porque as pesquiso e as ensino aos alunos e aos leitores. "Jardineiro", porque nos romances e contos, eu as trato como flores, para fazer buquês que, espero, levem bons aromas, novos significados, mensagens, entretenimento e segredos embutidos, como as flores. Não sou "gigolô das palavras", como se autodefiniu Luís Fernando Veríssimo. Eu as trato com amor! Aliás, não sou o único a fazer isso, claro. Sérgio da Costa Ramos, para mim o maior cronista do Brasil, faz isso tão bem ou melhor do que eu. 4- Você vem da literatura, já publicou diversos romances e contos. Como é para você escrever para uma revista? Quanto à linguagem, é preciso adaptar-se. O estilo não é o mesmo dos contos e dos romances, não pode ser o mesmo dos "papers" acadêmicos, senão meus textos não seriam entendidos pelo grande público, nem sequer lidos. Quanto a tamanhos e prazos, eu aprendi desde os meus verdes anos a ter disciplina no trabalho e em tudo o que eu faço, ou em quase tudo. Nunca atrasei uma coluna. 5- Há alguma palavra com significado especial pra você? Sim, muitas. Gosto muito de "açucena", uma planta ornamental, que veio do Árabe "as-susana", cujo étimo foi parar em nomes femininos em várias línguas, e que significa lírio, o tal copo-de-leite, como é mais conhecido no Brasil meridional. O "sim" é muito bonito, não apenas nos casamentos, mas nas concessões, nas ajudas, na solidariedade. João Cabral de Melo Neto tem um verso que diz "é tão belo como um sim numa sala negativa", em canção que o Chico Buarque gravou. "Não" também é bonito, ainda mais que tem este xibolete que só o Português, a língua do "ão", tem. 6- O que você gosta de fazer nos momentos de lazer? Ouvir música, principalmente clássica, ler, conversar com amigos, principalmente à beira de pratos e copos, comendo e bebendo, vinho principalmente, pois "in vino veritas" (no vinho, a verdade), e minha maior paixão, inclusive diante das pessoas, é pelo conhecimento, que, como sabemos, desde os tempos míticos do Paraíso traz a morte, pois morreremos disso desde a velha praga divina: "No dia em que comerdes do fruto da árvore do conhecimento, morrereis". Era o fruto proibido! 7- Atualmente mora onde? Vem com frequência vem a Florianópolis? Moro no Rio de Janeiro há doze anos! Desde que, pelo romance "Teresa D´Ávila", já adaptado para teatro, meus ex-colegas da infância e da adolescência me redescobriram, venho com muita frequência a Florianópolis para encontrá-los, principalmente ao Wilson Volpato, seus familiares e amigos comuns. Eu adoro a prosa catarinauta, tão rara em minha vida de expatriado do estado. Os catarinenses têm uma melodia na voz, falam cantadinho, um diapasão que eu perdi no rude sotaque de gaúchos e parananenses, nas palatais retroflexas fortes de paulistas e paulistanos, no chiado de cariocas e fluminenses. E desde há alguns anos, passo uma semana por mês em Florianópolis para desenvolver com Laudelino Sardá um projeto editorial na Unisul, a convite do reitor Salésio Herdt.

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