NOME DE POBRE NO BRASIL

sábado, 13 de julho de 2013

EDWARD SNOWDEN NÃO SABE DE NADA

Minha crônica deste fim de semana. A versão impressa sai no jornal Primeira Página.
Essas bisbilhotagens todas que estão acontecendo na internet me fazem viajar de volta à infância, quando todos sabiam de tudo da vida alheia. Não havia computadores nem celulares, mas ainda assim os vizinhos sabiam mais do que deviam. E os que não eram vizinhos, logo ficavam sabendo também, uma vez que todos contavam tudo para todo mundo, sempre de um modo diferente, pois quem conta um conto, aumenta um ponto.
A fofoca corria, ou melhor escorria, de boca em boca. A fofoca é uma das mais sólidas provas de solidariedade. A pessoa que faz fofoca, está preocupada com a vida alheia. Esta definição não é minha, é de Mário Quintana, e eu a ouvi muitas vezes antes de ela ser escrita, na casa de Nydia e Josué Guimarães, meus queridos amigos, infelizmente já falecidos os dois, pois tudo passa nesta vida, e passam também as pessoas que amamos. À definição do poeta acrescentei mais duas características da fofoca. O fuxico demonstra que a pessoa não é indiferente, é modesta, em vez de cuidar da própria vida, cuida da dos outros. E outro traço dos fofoqueiros é a delicadeza: em vez de falar na frente o que acham e sabem da pessoa de quem falam, o que poderia ser uma rudeza, falam pelas costas, sem causar constrangimento. Às vezes, aliás, a pessoa não fica sabendo quem foi quem falou o quê a seu respeito. Muito antes de 1984, o celebérrimo romance de George Orwell, em Siderópolis (SC) e em Jacinto Machado (SC) também, o Grande Irmão, uma entidade formada de centenas ou milhares de pequenos irmãos, sabia de tudo a respeito de todos. Edward Snowden, menino, preste atenção! Foi sempre assim! A diferença é que em Siderópolis e em Jacinto Machado todos sabiam de tudo sem computadores e sem telefones celulares. Passei toda a minha infância sem telefone fixo! Aliás, uma das instituições mais referenciais daqueles anos eram os Correios e Telégrafos. Más línguas diziam que dali jorravam muitas notícias. Às vezes muitas outras pessoas sabiam da novidade ainda antes do destinatário! Saiu uma pesquisa recente nos EUA, o país onde foram inventados a internet o telefone celular, o smartphone etc. Pois bem, eis as descobertas: 78% dos jovens entre 13 e 1 7 anos já têm seus próprios celulares. E 47% deles têm smartphones. Cada um deles manda cerca de 60 mensagens por dia. E 23% deles já têm e usam tablets também. Na internet roda um cartum que resume tudo: uma criança se queixa a Barack Obama: “meu pai disse que o senhor nos monitora pela internet”. E o presidente dos EUA replica: “Ele não é seu pai”. Surpreso, eu? Tudo igualzinho à minha infância profunda! Mudaram apenas os meios, os fins continuam os mesmos. Temos grande atração pela vida alheia. Aliás, muito parecida com a de todos nós, embora, claro, ninguém queira reconhecer esta verdade religiosa e psicanalítica. Havia uma exceção: só quem não contava nada era o padre. E ele é quem sabia mais do que todos os outros. (xx). º Da Academia Brasileira de Filologia, escritor e professor, doutor em Letras pela USP (xx).

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